João Ribeiro

Nosso acadêmico esquecido

Marcio Monteiro, 03 de Agosto, 2020 - Atualizado em 03 de Agosto, 2020

Esta semana recebi uma mensagem de um amigo e professor que reside na cidade de Laranjeiras, lembrando-me de um assunto sobre o qual havíamos conversado há alguns meses e que me provocou uma grande indignação. Trata-se do estado de abandono em que se encontra o patrimônio arquitetônico da cidade que no passado foi considerada a Atenas Sergipana. Fiquei particularmente preocupado com fotos que recebi na mensagem mostrando o estado lastimável em que se encontra o imóvel onde nasceu João Ribeiro.

Desconhecido da maioria dos sergipanos, João Batista Ribeiro de Andrade Fernandes é mais uma daquelas personalidades que nunca tiveram o merecido reconhecimento dos seus conterrâneos, e o descaso com a conservação da “Casa de Cultura” é a prova cabal dessa falta de atenção e cuidado na preservação da memória deste jornalista, crítico, filólogo, historiador, pintor, tradutor e um dos mais importantes intelectuais do seu tempo, que nasceu na cidade de Laranjeiras, e que ao lado de Augusto Franco representam os seus dois mais ilustres filhos.

João Ribeiro foi amigo de Quintino Bocaiúva, José do Patrocínio, Machado de Assis e Silvio Romero, entre outros, e um apaixonado pela Filologia e História. Destacou-se como correspondente e colunista de grandes jornais, além de ter sido um dos principais promotores da reforma ortográfica de 1907. A qualidade e a farta produção literária o credenciaram para ter acesso a uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, tendo posteriormente declinado do convite de presidir a Instituição em razão do seu compromisso de vida com o magistério.

Assim como João Ribeiro, tantos outros tiveram que partir de Laranjeiras na busca dos seus sonhos e das oportunidades de trabalho e melhoria das condições de vida proporcionada pelo ambiente econômico da capital. E Laranjeiras, que em 1850 teve a honra de recepcionar o imperador Pedro II e a imperatriz Teresa Cristina, e implantar a primeira alfândega do Estado em razão da sua importância sócio econômica, nos primeiros anos do Século XX começou a perder o dinamismo econômico, a efervescência cultural e ver a saída das famílias mais tradicionais.

Restou a Laranjeiras uma população empobrecida e analfabeta que sobrevivia do trabalho braçal ofertado pela monocultura da cana-de-açúcar. Fato que levou à decadência e a deterioração do patrimônio arquitetônico, mas que em contrapartida fizeram florescer e diversificar inúmeras manifestações folclóricas que levaram o município a ser uma referência em matéria de tradição de manifestações da cultura popular. Muitos dos conjuntos de casarios históricos da cidade foram deixados à mercê das intempéries, ao ponto de em alguns restarem apenas suas fachadas de alvenaria. 

Antes de ser questionado sobre a razão do meu particular interesse por Laranjeiras, explico. Quando cheguei a Aracaju no início dos anos 70, ingressei no curso de Administração (UFS), prestando estágio na Superintendência de Obras Públicas do Estado de Sergipe – SUDOPE, órgão que concentrava todos os projetos de obras do Governo do Estado. Lá tive a honra de trabalhar com o ilustre arquiteto Wellington Costa, que na época iniciava um trabalho de levantamento de dados visando a restauração de prédios históricos em São Cristovão e Laranjeiras.

Meu trabalho era de realizar um levantamento socioeconômico nas duas cidades históricas com participação de estudantes das redes públicas locais. Paralelamente a essa atividade, ajudei na realização de medições nos principais casarios históricos das cidades, visando projetos de restauração dos prédios mais representativos. Em Laranjeiras seriam contemplados três imóveis, o Teatro, o Trapiche e a Casa de João Ribeiro. Apenas o Teatro ficou de fora, pois havia sido totalmente descaracterizado pela instalação de uma espécie de cortiço.

Minha primeira visita técnica em Laranjeiras foi exatamente ao imóvel em que nasceu João Ribeiro. Lá ajudei a realizar as complexas medições e também a descrever o imóvel, práticas que adquiri na convivência com os arquitetos e desenhistas da SUDOPE. Anos depois de me formar, tive a oportunidade de visitar Laranjeiras num daqueles tradicionais Festivais de Folclore e ter a felicidade de ver concluídos os dois projetos: a Casa de Cultura João Ribeiro e o Trapiche.

Desde então nunca mais havia estado no referido imóvel que foi restaurado na década de 70, e que para minha tristeza, recebi do amigo professor, algumas fotos mostrando o estado deplorável em que se encontra a Casa da Cultura João Ribeiro, acompanhadas de um texto do qual extraí o seguinte comentário: “Todo esse vasto conhecimento e os serviços prestados ao povo brasileiro, não foi suficiente para garantir que sua memória fosse tratada com respeito e dignidade.”

Faço das palavras deste professor as minhas palavras para expressar toda a indignação de ver o estado de abandono em que se encontra este imóvel modesto, mas de grande valor histórico. Por tudo que representou para Sergipe, e Laranjeiras em especial, João Ribeiro não merecia ter simplesmente uma “Casa Cultura” entregue à sua própria sorte, mas um Memorial, onde sua história pudesse ser conhecida, preservada e sua memória reverenciada. A gestão municipal deve e precisa buscar parceiros públicos e/ou privados que adotem o espaço, e com apoio da Universidade Federal de Sergipe e do IPHAN, possam restaurar e transformarem a casa em que nasceu João Ribeiro numa atração local e um centro de divulgação da obra deste grande sergipano.

Penso que o que importa é lançar sementes, mesmo que sejam na forma de idéias compartilhadas e plantadas em meio virtual, pois assim como na natureza, sempre acredito que em qualquer algum momento serei surpreendido com alguma coisa brotando no solo fértil dos bons propósitos. 

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