A PANDEMIA E SEUS ADORNOS Manoel Moacir Costa Macêdo

Manoel Moacir, 13 de Novembro, 2020

As pandemias trazem dores, sofrimentos e mortes. Marcas visíveis da sua passagem. Não avisam, aparecem de surpresa. Deixam rastros de dores e expiações e marcam o tempo antes e depois delas. A ciência não acode os seus males. O estado não cuida igualmente dos seus cidadãos. A sociedade ignora as suas lições e aguarda o “tudo passa”.

A Covid-19 não foi diferente de outras pestes. Mortes, sofreres, desemprego, abandono e privações. Hipócrita a surpresa da antiga, persistente e vergonhosa desigualdade. Assombros inaceitáveis das conhecidas carências da saúde pública aos vulneráveis e excluídos. Não espanta a indiferença dos que muito tem, perante os que nada possuem. O “velho normal” de uma elite insensível e atrasada. Registros atualizados da cruel escravidão. A pandemia matou mais pobres que ricos; mais negros que brancos; mais favelados que bem-nascidos; mais frágeis que destacados; mais dependentes da saúde pública que protegidos da privada e mais desempregados que empregados.

Passados oito meses, descontado o mês de fevereiro, quando aqui chegaram os gringos do velho mundo com o “nano-coronavírus” na bagagem e derramaram no carnaval e belezas tropicais. O mesmo fizeram os nativos bem dotados em retorno do turismo de verão em solos europeus. Ambos os agentes da Covid-19. Mais uma expressão da desigualdade. A conta não é determinista e poderia ser outra, ao invés de milhões de contaminados, milhares de mortes, corrupção e desvio de recursos públicos para salvar vidas. A contaminação permanece de “acelerada a reduzida”. Distante da esperada vacinação. Salve-se quem puder.

A terapia recomendada pela ciência continua a mesma: uso de máscaras, distanciamento social e higiene das mãos. Pressuposto de que todos são iguais no seu cumprimento. Não é verdade. A desigualdade de renda, moradia, educação e trabalho impossibilitam a igualitária terapia. A Covid-19 não é democrática na contaminação e letalidade. Ela trouxe novos adornos no vestir e uso das máscaras na convivência social. Um olhar mais atento sobre as máscaras, chama atenção os modelos, cores, formas e usos. No pescoço, na orelha, na testa e nas mãos. Em alguns casos, não protege nem a si, nem o outro. Numa pandemia, o interesse coletivo sobrepõe o individual. Todos estão suscetíveis à contaminação. Máscaras com arte, humor, propaganda, protesto afeto e identidade. Tecidos, cortes criativos e até eróticas. Exposições do ser e sentir.

Merece atenção o uso de máscaras no ambiente público. Não estão incluídos os ciclistas e motorizados. O sentir coletivo dos que “usam as máscaras” no relato de um anônimo: “eu tenho usado máscara quando vou aos lugares. Incompreensível ser ridicularizado como ‘viver com medo’. Quando uso a máscara significa, educação por saber que posso ser assintomático e transmitir o vírus aos demais. Sinto responsável e respeitoso, contribuindo para a minha segurança e dos outros. Usar máscara não me faz fraco, assustado e estúpido, ao contrário me torna responsável e cuidadoso. Quando penso na aparência, desconforto ou opinião dos outros, imagino o filho, o pai, a mãe, o avô, os tios e tias ou mesmo o estranho entubado em um respirador e sozinho no leito de UTI”.

O comportamento dos que “não usam máscaras” e sentem incomodados pelos “que usam”. Descabido constrangimento para os que cumprem as orientações sanitárias e legais. O inconveniente acontece nas aproximações entre “os com e os sem máscaras”. Os “sem máscaras” são indiferentes, desprezam o distanciamento e em alguns casos utilizam as próprias mãos para cobrirem a boca e o nariz, como se máscaras fossem. Atitude enganosa, egoísta, agressiva e mal-educada. O “nano-coronavírus”, circula livremente entre os dedos contaminados das mãos e os próximos. Estudos recentes, demonstram que “as pessoas que relutam em usar máscaras e que desafiam as normas de prevenção teriam mais características associadas a transtornos de personalidade antissocial. E, ao não reagir aos sentimentos provocados por outras pessoas, estariam mostrando que não se importam muito com o bem comum”.

A humanidade sofreu tragédias mais dolorosas que as pandemias e não se tornou piedosa, solidária e misericordiosa. No dizer do filósofo Saint-Simon, aconteceu “o eterno retorno do mesmo”. Não haverá um “novo normal”, enquanto a desigualdade não for reduzida, a saúde pública não cuidar dos pobres e excluídos e a educação não acolher todos indistintamente.

Manoel Moacir Costa Macêdo é engenheiro agrônomo

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