Foi João quem fez

Por Márcio Monteiro

Marcio Monteiro, 23 de Dezembro , 2019 - Atualizado em 23 de Dezembro, 2019

 A frase título repetida durante décadas de acirradas disputas políticas polarizadas nas oligarquias dos Franco e dos Alves, transformou-se em jargão sempre lembrado e difícil de ser questionado nas campanhas eleitorais, pois remete ao grande legado de obras e realizações de João Alves Filho, que indubitavelmente o colocam entre os grandes sergipanos.

Durante muitos anos confesso que me incomodei com a forma demasiadamente passional com que os seguidores do João Alves defendiam suas ideias e rechaçavam aqueles que confrontassem com os pontos de vista. O “Negão”, apelido carinhoso que ele mesmo insistia em usar nas campanhas eleitorais, acredito que mais do que uma jogada de marketing, foi uma forma de demonstrar intimidade com a gente sergipana e que enxergavam nele um legítimo representante, alguém identificado com o sertanejo e sua lida e agruras no enfrentamento da seca.

Lembro me que ao se aproximar a conclusão da obra da Ponte Aracaju - Barra dos Coqueiros, integrantes de uma importante instituição privada à qual pertenço, chegaram a propor a confecção de um monumento com o busto de Dr. João Alves para ser colocado na cabeceira do lado do bairro industrial para ser inaugurado juntamente com a obra, numa homenagem de agradecimento ao então governador. Na ocasião me opus à ideia e naturalmente arrebanhei muita antipatia entre meus pares, mas entendia como inoportuna, pois certamente seria considerado um ato de adesão ideológica e minha preocupação era unicamente de preservar a instituição de uma inevitável vinculação politico partidária.

Anos se passaram e a convivência com pessoas que construíram suas carreiras exitosas no serviço público, durante as gestões de João Alves no à frente do Governo do Estado, levaram-me a entender a razão de tanta gente seguir cegamente as suas ideias. Era muito forte o sentimento de gratidão ao Dr. João, sentimento traduzido na forma de fidelidade política, fosse qual fossem os seus posicionamentos durante eleições. À medida que o tempo passava, percebia também que o legado de João Alves cada vez mais me convencia de que mais do que um político, ele demonstrava ter sempre uma espécie de banco de projetos na cabeça, fosse no exercício do governo estadual ou municipal de Aracaju, que fazia dele um grande tocador de obras de infraestrutura de grande relevância, que transformaram o Estado de Sergipe e beneficiaram especialmente a Grande Aracaju.

João Alves deu início à sua rica biografia a partir dos anos 1960, quando começou a trabalhar com seu pai na Construtora Alves, atividade que logo teve que abrir mão para cursar Escola Politécnica da Universidade da Bahia, onde graduou se em engenharia em 1965. Demonstrando ter espírito empreendedor, no mesmo ano fundou a Habitacional Construções, que em pouco tempo viria a ser uma das mais respeitadas empresas do setor no Nordeste. João Alves assumiu seu primeiro cargo público em 1975, na qualidade de prefeito (biônico) de Aracaju, indicado por militares na gestão do governador José Rollemberg Leite. O fato de ser o primeiro e único governador negro de Sergipe, por si só já demonstra que apesar de sofrer discriminação velada da sociedade, até então habituada a colocar nos palácios Olímpio e Inácio Barbosa gestores branquelos e oriundos de famílias tradicionais, João Alves quebrou a tradição e caindo nas graças dos sergipanos. Manteve ao longo de sua trajetória política um eleitorado fiel e conservador, mesmo tendo mudado de Partido em quatro oportunidades (ARENA, PDS, PFL e DEM).

Venceu sua primeira eleição ao governo do estado em 1982, cargo que voltaria a ocupar em 1990 e 2002. Esteve à frente do Ministério de Estado do Interior de 1987 a 1990, por indicação do presidente José Sarney. Exerceu o cargo de prefeito de Aracaju em duas gestões, 1975 e 2013. Em 2016, com a saúde debilitada foi abrigado a encerrar suas atividades laborativas e se afastar da política. João Alves antes de ser um homem público foi um empresário visionário, o que lhe favoreceu politicamente, pois criou gosto em liderar grupos e não se apressava em fazer oposição pura e simples, usava do aprendizado que lhe proporcionaram as muitas viagens, dentro e fora do país, acumulando conhecimento, experiências exitosas e boas referencias que lhe serviram de inspiração em muitos dos seus planos de governo.

Gostava de confrontar ideias e defender seus pontos de vista, especialmente sobre temas polêmicos, a exemplo do debate sobre a conveniência ou não de realização da obra de Transposição do Rio São Francisco. João Alves podia divergir sobre esse ou aquele assunto, mas falava (e como falava e gesticulava!) sorrindo na maioria das vezes, com a convicção de quem está com a verdade e de ser detentor das soluções para ajudar a melhorar a vida do cidadão, especialmente através da realização de obras de infraestrutura. Alguns ainda dizem que João Alves cometeu a maior agressão ao meio ambiente de Aracaju ao urbanizar a Coroa do Meio. Ora! Se a iniciativa não tivesse sido tomada por ele, hoje existiriam apenas dunas de areia e não um novo bairro urbanizado! Depois de uma importante intervenção do seu oponente e prefeito Marcelo Déda na região do Apicum da Atalaia, parece que o mangue na região conspirou a favor de Dr. João e ficou mais exuberante com o passar dos anos. Em 2013, cria a Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Aracaju, mas não pensem que João Alves tomou a decisão para se redimir, ao contrário, ele sabia das agruras enfrentadas pelos empresários para aprovarem projetos, cuja licença ambiental dependia de órgão do Estado.

João Alves foi sempre um construtor, tanto na vida pública quanto na iniciativa privada, mesmo que tivesse que buscar os recursos externos. Um modernizador que escreveu sua história conciliando política com a atividade empreendedora. Seu maior legado foi de ter se empenhado durante o exercício de cargo público a realizar obras de infraestrutura essenciais e que fizeram a diferença na transformação socioeconômica de Aracaju e de Sergipe. Se existiu um político que alavancou a vida de muitos sergipanos e que contribuiu para construir a casta de funcionários públicos do Estado, este foi o João Alves. Com isso ele criou um exército de fiéis escudeiros que o defendem e apoiam em qualquer situação, mesmo nos momentos de dificuldades econômicas envolvendo seus negócios privados (construtora, rádio e jornal), ou nos escândalos que lhe deram muita dor de cabeça, como: CPI do Orçamento, Banestado Leasing e Operação Navalha.

Tentei pessoalmente entregar ao prefeito João Alves um ofício com demandas da classe empresarial ao fim da sua última gestão em Aracaju, mas àquela altura dos acontecimentos João Alves já apresentava sérios problemas de saúde que acabaram por agravar ainda mais a gestão municipal, e prenúncio de que a sua longa e exitosa carreira política tinha entrado no seu derradeiro capítulo. A persistência e conhecida teimosia levaram João Alves ao limite do desgaste político, o que certamente contribuiu ainda mais para o processo de fragilização física e comprometimento da sua saúde. Apesar das dificuldades de sua última gestão, podemos creditar a ele algumas ações marcantes como a solução do problemão da Rotatória do Caju; aprovação do Plano de Mobilidade Urbana de Aracaju, e contrariando a tudo e a muitos, construiu a bela Orlinha da Praia Formosa.

João Alves será sempre reverenciado por ter realizado obras da grandeza do Hospital de Urgências de Sergipe – HUSE, do Platô de Neópolis, da Orla de Atalaia, do bairro da Coroa do Meio, das pontes Godofredo Diniz e Aracaju-Barra dos Coqueiros, do Sistema Integrado de Transporte de Aracaju, do Parque da Cidade, de 14 avenidas de Aracaju, da Maternidade N. S de Lourdes, do Projeto Chapéu de Couro com sua adutoras (Alto Sertão, Sertaneja, Piauitinga, Agreste e Baixo São Francisco), entre outras. João Alves será lembrado como um dos grandes ícones da história de Sergipe pelo seu legado de realizações e sobretudo pelo amor à sua terra.

Este breve relato é também a forma que encontrei de me penitenciar e reconhecer, que apesar de não endossar alguns posicionamentos políticos, reconheço em Dr. João Alves, um ícone que escreveu seu nome na história dos grandes personagens da história de Sergipe. Afinal não dá para negar que muito do que temos foi “João quem fez”, fez muito e será sempre merecedor da estima e reconhecimento de todos, inclusive deste modesto “forasteiro” que há muito superou essa pecha.


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