Lei da igualdade salarial: impactos para as empresas e as necessárias adequações

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A premissa da Lei nº 14.611, de 3 de julho de 2023 de igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres merece louvor e se harmoniza com paradigmas internacionais, Como as Convenções da Organização Internacional do Trabalho – OIT de números 100 e 111, que tratam, respectivamente sobre a igualdade de remuneração e discriminação e com comandos da nossa Constituição sobre igualdade (art. 5º, caput) e sobre a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX).

Sem embargo, todavia, da incontestável relevância de se promover a igualdade salarial entre homens e mulheres, os mecanismos adotados por essa Lei e seus regulamentos – Decreto 11.795/23 e Portaria 3.714/23 – violam os próprios princípios constitucionais alicerces da premissa que se quer efetivar com impactos preocupantes para o setor produtivo.

Esse arcabouço legal determina que empresas com 100 (cem) ou mais empregados são obrigadas a publicar, semestralmente, relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, com a finalidade de comparar salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos entre homens e mulheres, contendo, no mínimo: (a) cargo ou ocupação, conforme a CBO; e (b) o valor do salário contratual, do 13º salário, de gratificações, comissões, horas extras, adicionais (noturno, insalubridade, periculosidade, etc) aviso prévio, descanso semanal remunerado, gorjetas e outras parcelas que componh am a remuneração por força de lei ou norma coletiva.

Esse relatório é elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego – MTE com base nas informações prestadas pelas empresas no eSocial e informações complementares extraídas de um questionário preenchido por elas no Portal Emprega Brasil. Cada empresa deve publicar o seu relatório nos seus sítios eletrônicos, redes sociais ou similares, com ampla divulgação, nos meses de março (o que já ocorreu esse ano) e no setembro.

Com essa publicação, as empresas nas quais forem identificadas desigualdades salariais e de critérios remuneratórios deverão elaborar num prazo de 90 (noventa) dias uma plano de ação com medidas para mitigar ditas desigualdades, com metas, prazos e mecanismos de aferição de resultados, planejamento anual e avaliação das medidas de forma semestral; promoção da diversidade e inclusão no trabalho; e, capacitação e formação das mulheres para ingresso e ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições.

Destaca-se que a elaboração e implementação do plano deve contar com a participação de representantes sindicais e dos empregados, na forma estabelecida por instrumento coletivo, e, se inexistente, por meio de comissão de empregados (art. 510-A CLT).

Tal marco legal, contudo, é inconstitucional, pois despreza as hipóteses legítimas de diferenças salarias conformadas pelo legislador no artigo 461 da CLT, que permite salários diferentes para o mesmo cargo ou ocupação, quando atividades na mesma função são prestadas ao mesmo empregador, mas estabelecimentos distintos ou em trabalhos com diferente produtividade e perfeição técnica ou diferença de tempo de serviço entre trabalhadores na mesma função superior a quatro anos ou diferença de tempo de função na mesma empresa superior a dois anos ou existência de plano de cargos e salários. & lt; /span>

Também viola os princípios do contraditório e da ampla defesa, pois o relatório deve ser publicado independentemente de as empresas poderem justificar eventuais diferenças existentes e calcadas em justificativas legais. Se a empresa não publicar o relatório estará sujeita à multa administrativa no valor de até 3% (três por cento) da folha de salários da empresa (limitado a 100 saláriosmínimos). Se publicar, e, se constatada diferenças salariais com base no relatório de transparência salarial estará sujeita a multa correspondente a 10 (dez) vezes o valor do novo salário devido pelo empregador ao empregado discrimin ado e indenização por danos morais.

É fato que há em trâmite Ações Diretas de Inconstitucionalidade – ADI perante o Supremo Tribunal Federal – a ADI 7612 promovida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e pela Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo (CNC) e a ADI 7631 promovida pelo Partido Novo – questionando a constitucionalidade da legislação em questão, mas ainda não há indicação de quando ocorrerá o julgamento que, ao que tudo indica, se dará pelo plenário.

Muitas empresas, entrentanto,  ainda não se deram conta, de que estando vigente essa legislação, podem ter impactos de imagem, concorrência, custos decorrentes da insegurança jurídica decorrente dessa chancela legal da subjetividade, que não deixa clara a necessidade de comprovação efetiva e indubitável da discriminação.

E, a solução mais adequada a ser adotada para a empresa, como o ajuizamento de ação judicial, a elaboração do Plano de Mitigação e a defesa administrativa de eventual autuação da fiscalização trabalhista passa pela análise de cada caso concreto, pois cada estabelecimento tem uma realidade e uma justificativa específica.

Alerta-se, que já há um movimento do MTE para a criação de um planejamento específico para monitorar e fiscalizar o cumprimento dessa legislação. Isto significa que tais empresas devem se preparar não só para a defesa em relação aos eventuais autos de infração que lhes forem aplicados, mas também para elaborar e implementar o Plano de Ação no prazo de 90 (noventa) dias após à notificação da auditoria fiscal que identificou desigualdades com base nessa legislação.

Não se tem dúvida de que as empresas devem se antecipar na adoção de medidas e dos procedimentos afim de evitar ou mitigar os impactos à que estão sujeitas, sem perder de vista, a trilha da premissa da efetiva igualdade salarial objetiva e calcada nos princípios constitucionais.

Cristina Canedo, advogada nas áreas consultiva e contenciosa em Direito Empresarial, Tributário e Trabalhista. É formada em Direito pela Faculdade de Direito da Fundação Mineira de Educação e Cultura – FUMEC, pós-graduada em Direito Tributário pela Universidade Gama Filho e pela Fundação Getúlio Vargas – FGV.

Ana Paula De Raeffray é advogada, doutora em Direito pela PUC-SP e sócia do escritório Raeffray Brugioni Advogados


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