Na trilha dos orixás: a lei federal nº 10.639.

Carlos Braz, 01 de Agosto, 2021 - Atualizado em 01 de Agosto, 2021


 NA TRILHA DOS ORIXÁS 

Por Carlos Braz 

A historiografia brasileira foi pródiga em esconder a importância da contribuição africana na formação cultural brasileira e pouco produziu para desmitificar a imagem recorrente no imaginário popular, de uma África selvagem e inculta, um mito que se estabeleceu a partir da visão etnocêntrica do europeu, que a implantou em suas colônias americanas.

Usando erroneamente como parâmetro os estágios de desenvolvimento social (as culturas não se desenvolvem igualmente em todos os pontos da terra), as nações consideradas desenvolvidas promoveram a diáspora africana com o tráfico de escravos, e, já na contemporaneidade, com a política imperialista reconhecida como justa invadiram o continente africano, saqueando suas riquezas e escravizando seus habitantes em sua própria terra.

Para nós, brasileiros, a África se mostra muito próxima do nosso cotidiano porém muito longe do nosso conhecimento. Quase sempre a relacionamos com escravidão, natureza selvagem, máscaras, pobreza, fome, doenças e religiões profanas. Não é a África dos egípcios e outras grandes civilizações que dominavam conhecimentos superiores aos dos europeus.     

É essa lacuna que a lei federal nº 10.639, que tornou obrigatório o ensino da História da África e dos afrodescendentes pretende preencher. Afinal, precisamos conhecer as raízes que nos tornaram um país miscigenado. Conhecendo nosso passado poderemos  compreender melhor  o nosso presente e os problemas sociais dos negros de hoje, decorrentes de três séculos de um escravismo cruel e desumano  sempre justificado por interpretações endossadas até pela Igreja Católica

Como compreender que o tráfico negreiro organizado pelos ditos “civilizados” que inicia entre os povos africanos um círculo vicioso, que gerou uma guerra fraticida, onde homens aprisionados em combates eram trocados por diversos itens, como armas, ferramentas e outros utensílios?

Essa prática transferiu forçadamente para o Brasil milhões de pessoas que trouxeram consigo seus costumes e conhecimento tecnológico nas áreas da agricultura, mineração e metalurgia. O convívio de longa duração entre africanos, portugueses e brasileiros, proporcionaram trocas culturais diversificadas, que foram assimiladas e através dos tempos, construindo a diversidade que nos caracteriza e da qual devíamos nos orgulhar. 

Contudo, é  da republica positivista, implantada em 1889 com o lema ordem e progresso que surgem as vãs tentativas eliminar da história nacional nosso passado escravocrata e a miscigenação da nossa população. É o regime republicano que impõe ao negro o limbo social cujas consequências permanecem nos    Os ideais eugenistas foram abertamente defendidos nas primeiras décadas republicanas, adotada como válidos por antropólogos e sociólogos, mas o embranquecimento do povo brasileiro não passou de utopia.

Nesse contexto, o baiano Nina Rodrigues destaca-se na defesa da inferioridade congênita do negro em relação ao branco. O mito das três raças construtoras da identidade nacional, desenvolvido pelo antropólogo Darcy Ribeiro não  encontra eco no campo da historiografia brasileira contemporânea, que permaneceu evidenciando a colonização portuguesa como principal responsável pela nossa construção social, negligenciando a importância das etnias consideradas inferiores, o negro e do índio.

Capristano de Abreu em sua obra “Capítulos de história colonial” publicada em 1907, duramente criticada pela intelectualidade da época, é o primeiro historiador brasileiro a reconhecer a contribuição tripartite na construção da nossa cultura. Sua obra mesclou aspectos econômicos, geográficos, sociais e culturais, deslocando o foco da História do Brasil, até então escrita como uma história da colonização portuguesa.  

Posteriormente duas obras historiográficas contemporâneas analisaram a formação do povo brasileiro, reconhecendo que somos frutos da colonização portuguesa, e a miscigenação é parte desse processo. O pernambucano Gilberto Freyre, na sua obra Casa Grande & Senzala, lançada em 1933, mostra-se um crítico feroz da mestiçagem,  considerando-a a principal culpada pelo atraso desenvolvimentista nacional, e desenvolve a teoria da democracia racial existente no Brasil, açucarando a escravidão e inibindo os movimentos em busca de cidadania da população afrodescendente.

Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda, também procura por uma identidade nacional e a essência do homem brasileiro. Considera-o, assim como Freyre, miscigenado e herdeiro da estrutura politica econômica e social lusitana, com ênfase na família patriarcal e práticas escravistas. Contudo discorda nas questões relativas às violências e degradação presente no regime escravagista, considerando-o o responsável pelo nosso atraso econômico e social.

 

  

 

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