EMBRAPA E CEPLAC: ABRAÇO DE AFOGADOS (I)

Manoel Malheiros Tourinho e Manoel Moacir Costa Macêdo

Manoel Moacir, 04 de Junho, 2021

As organizações são estruturas criadas para alcançarem objetivos específicos como partes de processos institucionais existentes no mundo contemporâneo. Elas estão presentes em qualquer sociedade e espécies de governança, sistemas, formas e regimes de governo: capitalista, socialista, monarquia, oligarquia, aristocracia, democracia, ditadura, parlamentarismo e presidencialismo. As nações tem fábricas, lojas, hospitais, quarteis, escolas, centros de pesquisa, entre outras organizações que fazem a vida existir. As organizações modernas se movem segundo os ambientes, recursos, estruturas, objetivos e processos de gestão. Não são apenas estruturas físicas, a exemplo de prédios e equipamentos, ao contrário, abrigam ativos relevantes: pessoas, visões, missões, tecnologias, história, além da integridade moral e ética.

       Teorias acreditadas pela ciência permitem analisar as organizações complexas sob várias perspectivas. A mais completa procura entendê-las à luz da teoria de sistemas, compreender as organizações como um arranjo sóciotécnico: universidades e centros de pesquisa são parte dos sistemas sociotécnicos de ciência e educação, como a CEPLAC - Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira e a EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Elas não operam em circuitos fechados e imunes às influências do ambiente externo. Ao contrário, estão abertas à capilaridade entre os de fora e os de dentro. Em alguns casos essa é a essência das estruturas, das tecnologias e dos seus papéis, a exemplo das organizações de saúde em tempo de pandemia. As organizações não operam no vácuo social, mas em condições de “conflitos” de variada natureza. O reducionismo das suas funções, é um artificio, tal qual o axioma da química, as “CNTP - Condições Normais de Temperatura e Pressão” e o “Ceteris paribus” da economia, onde “tudo mais permanece constante”, exceto as herméticas variáveis em análise. Ambos são recursos metodológicos, vez que no mundo real “tudo está em movimento e tudo interfere em tudo”.

Nessa perspectiva, por exemplo, um evento no setor agropecuário brasileiro, expressivo da economia nacional, mereceu atenção. Trata-se de analisar à luz de conjunturas passadas e presentes o que impulsiona o arranjo organizacional para recuperar a cacauicultura brasileira com a criação da Unidade Mista de Pesquisa e Inovação do Cacau, corruptela atualizada do “velho convênio técnico-científico” entre CEPLAC e EMBRAPA, organizações reconhecidas mundialmente devido a eficiência e sucesso no determinado lapso-temporal. A CEPLAC foi modelo de uma ação integrada de pesquisa, ensino e extensão aplicada a um produto - o cacau -, que dinamizou a infraestrutura regional, apoiou o associativismo patronal e laboral, o sistema de crédito agrícola, a comunicação, a inovação e a industrialização regional, além da “Revolução Verde” no sul da Bahia. A CEPLAC, foi efetiva, eficiente e primorosa, em participar na ocupação da Amazônia no período do governo militar. O maior sucesso dessa missão está no fato do estado do Pará atualmente pontuar como o maior produtor de amêndoas de cacau nacional.

A EMBRAPA por sua vez, nasceu no pragmatismo da ditadura militar, como um modelo concentrado de pesquisa lastreado majoritariamente em centros de pesquisa por produtos, lógica avessa ao modelo difuso dos institutos de investigação. Naquela época, existiam os êxitos da CEPLAC no cacau, a exemplo do CEPEC - Centro de Pesquisa do Cacau, entretanto sem assumir os papeis derivados do ensino e extensão, ficando a sua “raiz pivotante” em produtos relevantes das cadeias agroindustriais e uns poucos nos biomas e na alimentação nacional.

A receita da Revolução Verde, orientou os propósitos da EMBRAPA no “aumento linear da produção e produtividade das lavouras e criações”, pela entrega de específicos “pacotes tecnológicos”, apartados das identidades históricas, sociais, econômicas e ambientais dos produtores rurais e seus modos de produzir e viver. A referência era a monta das inovações incorporadas em determinados produtos agropecuários na lógica reconstruída pela “inovação induzida” dos fatores de produção intensivos em capital, independentes de externalidades negativas. Um sistema nacional de pesquisa coordenado pela EMBRAPA, de assistência técnica pela extinta EMBRATER – Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural, de crédito, e de programas de comercialização e uso de insumos químicos incentivados com recursos públicos subsidiados foram atrelados às demandas da modernização da agricultura. Versão da introdução do capitalismo no campo.

O processo de colaboração entre as duas organizações estatais sob o véu do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento - MAPA, qualificam a se “amigarem”, no qual a estatal EMBRAPA ajudará a outra, a CEPLAC a fazer com eficiência o dever de casa como fez outrora, trinta anos passados. Será possível, ou será o benedito? Os objetivos são ambiciosos e transbordam a realidade das organizações isoladas em seus próprios mandatos, que passam a contrair uma cegueira às ameaças do seu entorno, ontem favorável e aplaudindo, hoje judiando e crucificando. Contingências permeiam a EMBRAPA e a CEPLAC, a primeira ainda respirando pela sua rica história, e a segunda agonizando.

Manoel Moacir Costa Macêdo e Manoel Malheiros Tourinho são engenheiros agrônomos e respectivamente PhDs pela University of Sussex, UK e University of Wisconsin, USA.

 

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