GENIALIDADE AOS OITENTA por Manoel Moacir Costa Macêdo

Manoel Moacir, 19 de Agosto, 2022 - Atualizado em 19 de Agosto, 2022

 

Foto: Getty Images

 


Gente com arte tem passado, presente e futuro. Alicerce e identidade. Raiz e história. Atitude e querer. Gente feliz. Sem arte, nada tem, trapos à deriva. Poesia, música, dança, cinema, literatura e pintura, não merecem o sofrimento, mas o divino e maravilhoso. A arte alivia e consola. Aplaude e vaia. Acalma e agride. Denuncia e protesta. A arte é resistência.

 


A arte samba, sonha e seduz. Ela fala, escreve e pensa. A arte sintetiza possibilidades e impossibilidades em singular dialética. Visível e invisível, em sua própria lógica. O tempo não existe para a arte -, ela nunca envelhece. Ás vezes preguiçosa, outras apressada. Nem feia, nem bonita -, uma cor própria. A arte não aprisiona -, livre por natureza. A arte é imortal -, encarna e reencarna.

 


A poetisa portuguesa Ana Luiza Amaral em ode à poesia, perguntou: “A poesia serve para que? A poesia de facto não serve para nada, não tem aplicação prática. Com a poesia não se faz uma mesa, não se constrói uma casa. Mas ela é absolutamente fundamental, porque como toda a arte, assiste-lhe não o pragmatismo, mas o simbólico, e nós humanos, precisamos do simbólico, que passa sempre pela nossa relação com os outros. Precisamos dele como precisamos de comer ou de dormir. Porque é sua dimensão estética, mesmo quando fala do horror ou da crueldade. A poesia, tal como a concebo, faz-nos acredito melhores pessoas porque nos move (podendo fazer-nos agir) e nos comove”.

 


Caetano Veloso, aos oitenta anos de existência terrena, expressa em carne, osso e espírito, tudo da poesia e algo mais. Um ser ocupado pela arte, na sua tradução egoísta. Ela o engoliu por completo. Tempo, amores, desejos, família, parceiros e amigos -, íntima simbiose com a arte. Maravilhoso e misterioso sempre. A arte, tatuou e ficou no artista. Canô e Zezinho, Santo Amaro da Purificação, berço da agronomia, rio Subaé, engenhos de cana-de- açúcar, massapê do Recôncavo da Bahia, “estação primeira do Brasil”, braços musculosos da escravidão, samba de roda, novena e Igreja de Nossa Senhora da Purificação.

 


Caetano, verbo “Caetanear” e adjetivo “Reconvexo” -, quarta dimensão da gramática vertida em poesia e música. O belo e erudito no “reconvexo”, em voz e veia de Maria Betânia, irmã e melodia cantada em tom maior. “Quem não é recôncavo e nem pode ser reconvexo”. Caetano, cumpre missões na arte, na política, na história e além delas. “É proibido, proibir”. “Vocês não sabem de nada”. “Eu organizo o movimento, eu oriento o carnaval”. A força e beleza de sua arte, atiçou o poder, a prisão e o exílio. A arte não calou, algemada hibernou no frio londrino. Aqueceu o seu coco em vibrações, sons e notas luminares. A arte não cabe no cárcere, ela é luz, cheiro, ar e amor.

 


Caetano, simples, bonito, magro e genial, baiano estreado antes, durante e por certo, após aos oitenta. Ultrapassou fronteiras e gerações, sem perder o afeto, a ternura e a identidade. Da Bahia veio, mas dela nunca saiu. O seu canto e poesia brilham nos oceanos atlântico, índico e pacífico. Inquieto, conectado e profético, como os gênios sensíveis e utópicos. O “verbo transitivo caetanear humaniza e significa uma entidade chamada Caetano”. A arte pode não servir para a vida, mas não se vive sem ela. Caetano Veloso pode não ser uma unanimidade, mas sem ele, seríamos menores.

 

Manoel Moacir Costa Macêdo, é engenheiro agrônomo e advogado

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