12 DE JUNHO, SILÊNCIO NA SERRANA BELA

Jerônimo Nunes Peixoto, 12 de Junho, 2020 - Atualizado em 12 de Junho, 2020

12 DE JUNHO, SILÊNCIO NA SERRANA BELA

Quem vive em Itabaiana, nos últimos cinquenta anos, sabe que, na virada do dia 11 para o dia 12 de junho, a cidade inteira se desperta para assistir reverentemente ao espetáculo de luzes, de sabores, de ritmos, de cores, de espocar de fogos e de muita, mas muita buzinação, deixando a Serrana Bela num clima efusivo de alegria e comemoração da vida nas boleias e nos incontáveis quilômetros de estradas, neste imenso continente chamado Brasil. É a festa do Caminhoneiro, que pede ao Padroeiro Santo Antônio, bênção dúplice, que atinge o coração dos apaixonados e eternos namorados e passagem para a vida dos heróis estradeiros, caminhoneiros inveterados ou neófitos.

É festa antecedida pela carreata mirim, quando, numa manhã dominical, as crianças e adolescentes desfilam com suas miniaturas de toda a sorte de veículo de carga que risca o chão do Brasil. A carreata mirim desperta nos corações pueris o sentimento de respeito pela figura do caminhoneiro e até faz alguns descobrirem sua real vocação: viver no mundo, de cidade em cidade, unindo os emissores e os receptores do progresso brasileiro; aproximar os extremos geográficos pelo ronco pressuroso das máquinas que dão sustento e vida a tantas famílias ceboleiras.

Cada um se arranja como pode: nas carrocerias abertas, travestidas de boates, de bares, ou de altares devocionais; em monumentos aos motoristas falecidos, nos últimos tempos, cujos nomes se estampam na frente, nas laterais ou no fundo de cada caminhão. Ainda, na alegria de reunir, numa única cabine, a família inteira para receber as bênçãos do padroeiro dos casamentos e da vida ao volante, pelas estradas afora. É uma festa maravilhosa, estupendamente sentimental, emocionante, que faz parte do Brasil parar, para dizer um “obrigado” aos transportadores de todos os produtos que circulam pelas estradas.

É ocasião para se exibirem os mais modernos caminhões, com suas tecnologias que quase chegam a dispensar o habilidoso serviço dos estradeiros. Mas, aqueles mais tímidos e tradicionais, cujo ronco já se cansou, cuja aparência já não encanta, também se fazem presentes. O brio da festa não se resume ao orgulho de ostentar o que é de última geração. Sua finalidade precípua é a celebração da classe dos caminhoneiros, motoristas e/ou proprietários, que deixam uns três dias sem viagem alguma, para arrumar o possante para a solenidade do barulho, da alegria, da euforia, suplicando a Deus a chance de vivê-la, no ano vindouro. Até o ano passado foi assim...

Hoje, dia para ficar na história de nossa gente, a chuva fina e fria lavava, nas primeiras horas da madrugada, as ruas silentes e entristecidas, sem fogos, sem luz, sem buzinas e sem o ronco dos motores, sem aquele elegante desfile para o qual, motoristas e familiares se preparam, enfeitando seus pesados veículos, bem como embelezando-se a si mesmos, para passarem um dia diferente, em que um misto de farra e de fé dá luz e vivacidade à Capital Nacional do Caminhoneiro. Uma madrugada sem gente nas ruas, sem calor e sem vida... só guardas noturnos se arriscaram a soar seus apitos, sem qualquer comparação ao ensurdecedor barulho de um 12 de junho que se preze!

A Covid-19 impediu – pela primeira vez na já tradicional efeméride – a realização de sua edição. Precaução preventiva, medo de maior número de mortes e solidariedade aos familiares, que perderam seus entes queridos, fizeram a Igreja e a Administração Municipal protelar as solenidades alusivas a Santo Antônio e aos caminhoneiros. Dia triste, quase de luto, por ser, nos últimos cinquenta anos, um 12 de junho especificamente dedicado ao amor entre casais, único combustível a dar sabor à vida, na querida Itabaiana. Não! Não é a mesma coisa! Sem a festa do caminhoneiro, perde-se um pouco da essência cultural de ser itabaianense.

Essa gente é ordeira e batalhadora, gente de fé e de esperança. Tudo o que não foi possível realizar, hoje, está devidamente guardado para um dia especial, que seja ainda neste ano, com fé em Deus! Mas, sendo impossível, ficará para o próximo ano, quando, barulho, luzes, ronco de motores, espocar de fogos, santuários móveis e as bênçãos do Santo Padroeiro serão altamente multiplicados e Santo Antônio vai interceder, para que a Serrana Bela volte a sorrir, com o brio da festa, com a alegria dos operários do volante, com a fartura de pão em todas as mesas e com a paz social. Até um dia desses de outubro!

Oh, vírus maligno e inclemente! Podes até protelar aquilo que é sagrado em nossa “ceboleirice”, mas nunca irás interromper o brio de nossa gente, a pujança de nosso povo e a coragem de nossos caminhoneiros. Tu passarás em breve para um passado distante e desprezado. Mas a festa do Caminhoneiro continuará despertando os corações aquecidos pela chama eterna do amor, pelo barulho dos fogos e pela intensa buzinação. A fé do povo serrano é bem maior do que tu, insano ser, cuja miserabilidade se faz atroz. Vivam os caminhoneiros de Itabaiana e viva Santo Antônio!

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