Só no estado, a Petrobras vai investir R$ 9 bilhões para desmobilizar 27 plataformas marítimas; o processo, chamado de descomissionamento, é bastante complexo e envolve uma série de empresas, estruturas e profissionais especializados




Sergipe se prepara para entrar em uma nova fase em seu setor de petróleo, que responde por boa parte de sua economia. Em abril deste ano, começou um processo gradual de desativação de antigos poços e plataformas de petróleo instalados em alto mar. É o chamado descomissionamento de poços, uma atividade complexa que envolve uma série de cuidados técnicos e ambientais, além de recursos e muito dinheiro. Só em Sergipe, a Petrobras vai investir cerca de R$ 9 bilhões para descomissionar 26 plataformas marítimas fixas instaladas no litoral do Estado desde o início da década de 1970, as quais já atingiram o máximo da sua capacidade de exploração.
O descomissionamento é adotado quando um poço ou campo de petróleo atinge um limite de viabilidade técnica para continuar funcionando, o que é conhecido no setor como amadurecimento, e o processo de exploração passa a se tornar antieconômico. Isto é: o trabalho empregado para extrair o produto daquele local deixou de ser compensável financeiramente.
“O petróleo não esgota no poço, mas a questão é que ele vai ficando cada vez mais difícil de ser extraído. Quando ele chega em um determinado nível e com os preços que são praticados hoje [por barril extraído], o poço já não é mais interessante como exploração. Então, esse descomissionamento é uma forma ecologicamente correta de fechar aquele poço, isolar e desfazer as estruturas que estão montadas em cima dele. O objetivo é fazer com que aquela atividade de exploração, que já não existe mais ali, venha a ser desmontada, desfeita, limpando [aquela área] do ponto de vista ambiental e garantindo segurança a todos”, explica o professor Paulo do Eirado Dias Filho, presidente do Instituto de Tecnologia e Pesquisa (ITP).
A Petrobras contratou uma plataforma autoelevatória, a PA-38, que já foi trazida para trabalhar no descomissionamento dos poços no Campo de Guaricema, a 9 quilômetros da costa sergipana. Ele foi a primeira unidade de produção de petróleo em alto mar no Brasil e estava em funcionamento desde 1969. As atividades de exploração em águas rasas se estenderam através das 27 plataformas instaladas nos campos de Guaricema, Caioba, Camorim, Dourado e Robalo, até serem definitivamente encerradas pela estatal, em 2020. O descomissionamento destas unidades está previsto no Plano Estratégico e de Negócios da companhia para o quadriênio 2025-2029.
Fontes do setor estimam que o descomissionamento de poços pode movimentar mais de US$ 210 bilhões em todo o mundo, ao longo dos próximos 25 anos. Eirado avalia que essa é uma tendência de mercado que vem crescendo no Brasil e em vários países, sobretudo os que já atuam há muitos anos na exploração de petróleo. No entanto, ele ressalta que isso não indica um suposto esgotamento da produção, pois o petróleo vem sendo buscado em outras regiões, inclusive de águas profundas. “Acontece de alguns campos ou alguns poços chegarem já nesse nível de maturidade, mas é uma ação contínua. Novos poços estão surgindo, inclusive com outras qualidades de petróleo e outras características geológicas, como o pré-sal, e o volume de petróleo tem sido incrementado sempre”, assegura.
Mercado aberto
O processo de descomissionamento envolve as etapas de desmontagem da estrutura da plataforma, de isolamento do poço e outros processos que evitem a contaminação ambiental por um possível vazamento dos resíduos de petróleo ali existentes. De acordo com o professor, ele exige uma espécie de “engenharia reversa” para desfazer toda a estrutura instalada em cada plataforma, além de uma logística com o emprego de biólogos, geólogos, engenheiros, mergulhadores, embarcações, guindastes e outros equipamentos pesados. Tudo isso abre espaço para uma série de empresas especializadas que são contratadas pelas proprietárias das plataformas para a execução do serviço (no caso, a Petrobrás).
“Além da operação no mar, ainda tem que todo um trabalho de retaguarda e um ambiente preparado para recepcionar esses materiais que vão sair da plataforma, virão para terra firme, precisam ser descontaminados e depois transportados para alguma reciclagem, alguma reutilização. Provavelmente, essas milhares de toneladas de ferragem deverão voltar para siderurgia, como matéria-prima para fabricação de novos aços”, diz Eirado, referindo-se ao reaproveitamento de materiais como aço, ferro e polímeros.
Toda essa movimentação, impulsionada pelos investimentos da Petrobras, vai exigir a implantação, estruturação e qualificação de empresas e profissionais não apenas para executar a desmontagem das plataformas em si, mas também dar retaguarda a todo esse processo. “É um movimento muito interessante para a economia do Estado, mas desde que a gente também ofereça condições para que as empresas se estabeleçam e operem aqui, inclusive com a parte de terra que vai dar apoio à reciclagem e preparar esses materiais para serem enviados depois a outros ambientes. E preparar a qualificação das nossas equipes, dos nossos engenheiros, para que eles possam também ocupar bons postos de trabalho”, aponta o presidente do ITP.
Ecossistema Tiradentes
Este novo flanco de atividade econômica também pode contar com as atividades e a expertise do Ecossistema Tiradentes, que engloba o ITP, a Universidade Tiradentes (Unit) e o Tiradentes Innovation Center (TIC), além do Tiradentes TechPark (TTP), que está em fase de implementação. As instituições já atuam fortemente em pesquisas científicas e projetos de inovação para o aperfeiçoamento da exploração de petróleo, gás natural e energias, bem como na formação de mão-de-obra qualificada nas áreas correlatas.
Destacam-se nesta estrutura o Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Processos (PEP), que forma mestres e doutores nesta área e tem a nota 6 concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes); e o Núcleo de Estudos em Sistemas Coloidais (Nuesc), ligado ao ITP, além de parcerias com grandes empresas do setor, a exemplo da Carmo Energy, da portuguesa Galp e da própria Petrobras. As pesquisas e projetos desenvolvidos são focadas no processo de transição energética, que vai muito além das demandas do descomissionamento de plataformas de petróleo. Muitos destes estudos são sobre o desenvolvimento de novas fontes de energia e de novos tipos de combustíveis, a partir do aproveitamento de resíduos e insumos naturais.
“Com certeza, o Grupo Tiradentes tem todo o know-how e todas as condições de desenvolver profissionais muito capazes. Estamos prontos para isso, buscando nos aproximar e conhecer mais as possibilidades que isso possa trazer para os nossos alunos e os nossos egressos”, pontua Eirado.
com informações da Agência Petrobras e do Governo de Sergipe