Impacto da desmobilização de plataformas petrolíferas no meio ambiente deve ser discutido

Especialista em licenciamento ambiental em Sergipe, Gabriela Almeida, chama a atenção para os cuidados que o descomissionamento das plataformas e campos de produção no estado requerem, pois é uma atividade relativamente nova, e sem regulação específica.

As discussões sobre a cadeia de óleo e gás em Sergipe realizadas no final do mês de julho, em mais uma edição do Sergipe Oil & Gás, grande evento para tratar sobre o setor energético sergipano, ainda ecoam. Durante as palestras e debates, muito se falou sobre o impacto econômico positivo desses produtos para a região, inclusive com o novo momento que o estado deve viver, com o descomissionamento de projetos offshore.

A literatura sobre o assunto afirma que descomissionamento é a descontinuidade das plataformas marítimas, sistemas flutuantes de produção, equipamentos submarinos e dutos. O descomissionamento de plataformas fixas de águas rasas foi um dos temas debatidos durante o Sergipe Oil & Gás, e consultores de empresas ligadas ao setor afirmaram que após desinvestimentos da Petrobras no estado, serão mais de 150 poços no mar, 26 plataformas e mais de 3,2 mil poços em terras para serem descomissionados.

Para esse processo, é estimado um investimento próximo a R$ 9 bilhões até o ano de 2026. O gerente geral de Gestão de Ativos de Descomissionamento da Petrobras, José Harlen Albino Dantas, esteve no evento e informou que existem mais de 540 Km de tubulações a serem recolhidas em Sergipe.

Mas como toda moeda possui dois lados, a dra. em Biotecnologia Industrial, especialista em licenciamento ambiental e presidente do Grupo GA Ambiental, Gabriela Almeida, chama a atenção para os cuidados com o meio ambiente que a operação de descomissionamento requer, especialmente por ser uma atividade relativamente nova, e sobre a qual não existe, ainda, uma legislação ambiental/regulação específica.

Impactos ambientais devem estar na pauta

Gabriela Almeida explica, ainda, que todo esse processo requer a emissão de licenças pelos órgãos regulatórios, a exemplo do IBAMA, da Agência Nacional do Petróleo (ANP) e Marinha do Brasil, e que historicamente, a exploração de petróleo no mar sempre apresentou grande potencial para gerar impactos socioambientais negativos, e justamente por isso, a regulação da atividade e fiscalização das empresas que atuam no setor sempre foram muito severas.

“Acompanhei as discussões e confesso que não ter visto um grande debate sobre a questão socioambiental, me deixou apreensiva. Fazer o caminho inverso, ou seja, encerrar os ciclos de operação e retirar toda a estrutura montada em alto mar, ou mesmo em terra, é algo novo no país, cujos impactos negativos, embora imaginemos serem grandes, ainda são desconhecidos, por isso, todo cuidado será necessário”, alerta Gabriela Almeida.

Ela salienta que estudos recentes sobre o tema apontam que, em alguns casos, deixar a estrutura das plataformas onde estão para serem utilizadas como recifes artificiais, e assim, ajudarem a ter mais biodiversidade marítima na região, seria uma das opções viáveis. “Inclusive, essa alternativa é passível de licenciamento pelo IBAMA, através da IN IBAMA 22/2009”, frisa.

Reaproveitamento das plataformas

Gabriela Almeida comenta, ainda, que além dessa possibilidade de transformar a plataforma em um novo habitat marinho, existem mais duas alternativas à completa remoção das estruturas em questão, e que estão sendo analisadas pelos órgãos de regulação: o tombamento do esqueleto em leito marinho, e a remoção parcial da carcaça.

A especialista pontua que, assim como são exigidas licenças para operar em terra, e que para serem concedidas requerem a apresentação de Estudos de Impacto Ambiental, para o descomissionamento elas também deverão ser exigidas, e construídas por empresas especialistas em licenciamento ambiental, para que façam toda a varredura da situação e apontem possíveis cenários de interferência dessa descontinuidade, especialmente na vida marinha e na manutenção da pesca como atividade econômica, e como manejá-los, caso ocorram.

“O licenciamento ambiental e todo um arcabouço de estudos sobre o tema devem ser apresentados, porque o prejuízo pode ser imenso e irremediável ao meio ambiente, e à sociedade em geral, pois pode afetar tanto a pesca quanto o turismo, porque não é apenas retirar a estrutura, mas saber como transportá-la e qual o destino que será dado a esse material posteriormente”, observa.

Gás natural

Além do descomissionamento, Sergipe também está na bola da vez por causa dos campos de gás natural existentes no estado, cujo anúncio da descoberta foi feito pela Petrobras em 2019. Quando do anúncio, a petrolífera informou que a estimativa era produzir 20 milhões de metros cúbicos de gás natural por dia, o equivalente a 1/3 da produção total do país.

Pesquisa feita pela Fundação Getúlio Vargas sobre o tema, e apresentada durante o evento Sergipe Day, no Rio de Janeiro, em março deste ano, mostrou que Sergipe pode ser um hub de gás, graças à abundância da substância tanto em águas profundas, quanto em terra. Na ocasião, a diretora da ANP, Symone Araújo, informou que Sergipe, hoje, ocupa 83% de adequação aos princípios da Lei do Gás, e o primeiro no ranking do Relivre.

“Nessa questão de petróleo e gás, a pauta ambiental deve andar passo a passo com a pauta de desenvolvimento e economia, porque se estiverem sem sincronicidade, as perdas podem ser tão grandes, que nem mesmo o investimento captado pela operação será capaz de amenizá-las”, finalizou Gabriela Almeida.

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