ITABAIANA – 350 ANOS. SAPATEIROS

Itabaiana, 350 anos. Sapateiros.
(por Antonio Samarone)

Antonio José de Santana (83 anos) – Tororoco, nasceu na Cova da Onça, Itabaiana, em 03 de maio de 1941. Filho de Manuel Marinho de Santana e Dona Maria Alves Santana.

O pai, Seu Marinho, eletricista, funcionário da Empresa Elétrica de Itabaiana, de Zeca Mesquita, era o responsável pela troca das lâmpadas da cidade. Durante a ditadura de 1964, a distribuição de energia elétrica em Itabaiana era privada.

Seu Marinho foi figura marcante em minha infância, éramos quase vizinhos, no Beco do Ouvidor, perpendicular ao Beco Novo. Mamãe não hesitava em pedir lâmpadas de rua a Seu Marinho, eram mais econômicas. Lâmpadas de 220 volts. A casa ficava na penumbra.

Além de Tororoco, lembro-me da grande família de Seu Marinho: Zé de Marinho, o mais velho; Gerivaldo, Dedida, Gustinha, Zé Carlos e Marizete.

A Empresa de Elétrica de Zeca Mesquita, funcionava sob a lógica pré-capitalista. Seu Zeca nunca mandou cortar o fornecimento dos inadimplentes. Vez por outra, a Empresa mostrava sinais deficitários.

Os postes das ruas eram de madeira, creio que de eucalipto.

Tororoco, antes virar sapateiro, vendeu balas no cinema e foi aprendiz de funileiro. Trabalhou com Seu Neca.

Não sei os motivos, mas Itabaiana e Simão Dias eram polos calçadistas em Sergipe. Historicamente, esses municípios, com Lagarto, compunham o polígono do gado.

Em Itabaiana, existiam muitos curtumes, e um grande armazém de couro, que vendia no crediário de longo prazo. Os sapateiros diziam: a seu Vieira, o dono do tal armazém, basta pagar no Natal.

Em Itabaiana, funcionavam dezenas fabriquetas (Tendas), onde centenas de sapateiros trabalhavam informalmente. Sem vínculo trabalhista. As tendas não abriam às segundas-feiras, era dia de folga para os sapateiros.

Lembro-me de alguns proprietários de Tendas, até a década de 1960: Vicentinho, Zé Martins, Zeca Pimentel, Zé de Gonçalo, Tonho de Boanerges, Zé Procópio, Faustinho, Flavio, Justino, Antonio de Ezequiel, Zé Correia e Zé Malhador. Devo ter esquecido de alguns, depois completo.

A chegada do capitalismo, com os seus sapatos industrializados, (Nova Hamburgo e Franca – SP) mais bonitos e mais baratos, inviabilizou as fabriquetas locais. Os sapateiros de Itabaiana perderam o meio de vida.

Calcula-se que a categoria de sapateiros, mestres e aprendizes, na década de 1960, em Itabaiana, superasse a faixa de três centenas. Ao lado dos alfaiates, padeiros, ourives, pedreiros, carpinteiros, marceneiros e fogueteiros, formavam a “classe operária” tradicional. Destaca-se, nessa década, o crescimento dos comerciários, motoristas e mecânicos.

Esse grupo de trabalhadores urbanos, começava a superar os camponeses, ferreiros, pataqueiros e feirantes, que dominaram nas décadas anteriores.

Itabaiana era uma cidade de poucos ricos e muitos remediados, pequenos comerciantes e biscateiros.

Uma parte dos sapateiros, com a chegada do sapato feito, embarcou no primeiro Pau de Arara, para o Sul maravilha.

Quando eu estudei no Rio de Janeiro, encontrei os filhos de Justino, Dedé e Dandinho, trabalhando numa sapataria de luxo na Barata Ribeiro. Faziam sapatos por encomenda, para os ricos, onde o consumidor botava o pé na forma, para comprar um sapato personalizado.

Outros migraram para Aracaju, onde os “Dédas” de Simão Dias, mantinham a ESCAL – Indústria Sergipana de Calçados, no Siqueira Campos, tentando competir.

Muitos meninos pobres de Itabaiana, fizeram o científico em Aracaju, trabalhando na ESCAL, e nas Fábricas de Geoba e Tororoco. Lembro-me de Dedé de Olga e Gerivaldo. Pedro Langanha estava no combo.

Depois, Geoba, um sapateiro de Itabaiana, montou a sua fábrica em Aracaju, nas proximidades da Nestor Sampaio. Tororoco, montou uma fabriqueta, em uma Vila, na Rua de Capela.

Esses sapateiros itabaianenses, exilados em Aracaju, montaram um competitivo time de futebol de Salão: o Itabaiana Futebol de Salão. Lembro-me de alguns craques desse timaço: Zé Nivaldo, Zé Américo, Horacio de Quinho, Tonho de Maria de Branquinha, entre outros. De fora, só o atleta Paraná.

Antonio José de Santana, Tororoco, foi treinador do Cantagalo e do Ideal. Narra a lenda, que Chico do Cantagalo só entregava 11 cartões, e orientava: “Seu Santana, escale o time!” Como, se Chico, o Presidente, já tinha escalado, ao entregar só os cartões dos jogadores de sua preferência.

Na década de 1970, o futebol foi uma locomotiva cultural em Itabaiana.

Seu Santana (Tororoco), torcedor do Vasco da Gama, é parte da Itabaiana Grande e da sua memória. Nunca se meteu na atribulada política local. Um homem de paz.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

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