Juiz não pode manter prisão preventiva quando o Ministério Público se manifesta pela revogação

Redação, 05 de Fevereiro , 2021

Juiz não pode manter prisão preventiva quando o Ministério Público se manifesta pela revogação

Por Carlos Henrique de Lima Andrade
Advogado Criminalista sócio e Mestrando em Economia pela UFS

No último dia 28 de janeiro de 2021, durante a sessão extraordinária da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Sergipe, foi travada discussão bastante relevante, e que levou um dos desembargadores, o Dr. Edson Ulisses, a pedir vista dos autos para melhor analisar a questão que, para os outros dois membros da Câmara, a era simples.

O caso referido no parágrafo anterior trata-se de Habeas Corpus, visto que o Paciente estava preso, e o advogado pleiteou a liberdade provisória do acusado, tendo o Ministério Público (MP) apresentado manifestação pela procedência do pedido, ou seja, liberdade provisória, pois entendia que naquele momento não estavam presentes as exigências legais da prisão preventiva. O juiz de primeiro grau, contudo, manteve a prisão, apesar do pedido da defesa e concordância do MP.

Inconformada, a defesa impetrou o remédio heroico junto ao Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE) e, no julgamento do mérito, a defesa sustentou que a manutenção da prisão preventiva do acusado pelo juiz de primeiro grau viola o Art. 311 do CPP, com redação dada pelo Pacote Anticrime, visto que é vedado ao juiz decretar a prisão preventiva de ofício.

Entendeu a relatora que o julgador não está vinculado ao parecer do órgão acusador, e que a manutenção da prisão do acusado, nesse caso, não viola o Art. 311 do CPP. Um dos desembargadores referendou o voto da relatora sustentando que o Art 311 se refere apenas à iniciativa, mas uma vez requerida a prisão preventiva por qualquer dos legitimados, o juiz estaria livre para decidir de forma contrária no curso do processo.

A tese primária do Desembargador Edson Ulisses é que se o juiz só pode decretar quando o legitimado pede, então quando esse mesmo legitimado pede para soltar, deveria seguir a mesma regra, ou seja, soltar.

A divergência tomou alguns minutos de discussão entre os três membros, muitas delas mais preocupadas com os poderes que o MP vem tendo que a própria discussão jurídica em si. Fato é que o processo foi retirado de pauta para melhor apreciação da dúvida do desembargador Edson Ulisses.

Sem o intuito de exaurir a indagação proposta no título, enfrenar a discussão é de suma importância após a nova redação dada pelo Pacote Anticrime ao Art. 311 do CPP.

Ora, a vedação ao juiz em decretar de ofício a prisão preventiva prevista no Art. 311 do CPP refere-se apenas à iniciativa ou essa vedação se estende para além da iniciativa, isto é, quando há representação e posteriormente quem pediu se manifesta pela revogação?

Independentemente da posição adotada, me parece que assiste razão o desembargador Edson Ulisses, ao afirmar que o processo penal brasileiro atual enfrenta o inconveniente de ser uma “colcha de retalhos”, com várias essências e filosofias, muitas delas contraditórias, o que tem ocasionado sérias divergências.

No entanto, ainda me parece que o Art. 311 do CPP, com a nova redação dada pela Lei n. 13.964/2019, tem uma mensagem clara: que ao juiz compete apenas decidir quando provocado e que ao órgão acusador cabe provocar quando for necessário, e, quando entender pela desnecessidade da provocação, deve ser atendido, pois nesse momento não há interesse genuíno da atuação do magistrado.

É evidente que vozes surgirão para afirmar que se essa linha de raciocínio deva prevalecer, pois o juiz estaria vinculado ao pedido do MP de absolvição. Aos que pensam nesse sentido, oportuno alertá-los que a discussão aqui travada, assim como no Habeas Corpus acima mencionado, diz respeito à prisão preventiva, cujo instituto foi muito influenciado e alterado pela nova legislação que, por sua vez, tem uma perspectiva nova.

Mais ainda assim, não é ousadia indagar: se ao Ministério Público cabe fazer juízo de valor no que se refere à iniciativa ou não da ação penal, neste momento em profundidade sumária, e após a instrução probatória percebe que houve equívoco ou fundadas dúvidas da culpabilidade e pede absolvição, por que o juiz deveria fazer as vezes do órgão acusador e condenar o acusado?

Voltando à questão norteadora proposta, parece que não há dúvidas de que o legislador quis que o juiz não decretasse de ofício a prisão, seja no que se refere à iniciativa ou seja durante o processo. Assim, se o próprio provocador, o mais interessado, entende em momento posterior que não há mais necessidade da prisão, não cabe ao juiz fazer as vezes da acusação e decidir de modo diverso, pois assim estaria assumindo uma função constitucional que não lhe é devida.

As funções do sujeitos processuais é clara. Ao juiz cabe decidir quando se pede. Ao MP, provocar, e aí se entenda tanto a ação penal quanto pedido de prisão. Essa atuação do órgão acusador leva em conta análises em distintas profundidades, dependendo sempre do momento processual.

Portanto, ao juiz não é dado o poder de decretar de ofício a prisão do acusado, mas apenas aos legitimados do Art. 311 do CPP. Quando o juiz recebe o pedido, sua função ali é observar se o pedido encontra respaldo legal e fático, assim, decidir de acordo com as circunstâncias apresentadas naquele momento.

Se em momento posterior há nova análise do legitimado, e nesse caso apresenta manifestação pedido a revogação da medida anteriormente pedida, não cabe ao juiz decidir de modo diverso. Na verdade, não faz sentido nem coerência. Pensar de forma diferente é fraudar o que pretende o legislador com a nova redação do Art. 311 do CPP.

Por fim, de suma importância mencionar que na discussão da pergunta proposta é preciso se perguntar se o debate busca entender melhor o sistema que se escolheu, ou o sistema que alguns querem que seja. A resposta dirá de qual lado o debatedor estará, e que muita crença e prestígio de muitas funções perderá holofotes.


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