A Guarda (quase) invisível

Marcio Monteiro, 29 de Outubro , 2021 - Atualizado em 29 de Outubro, 2021

 

 

Aproveitando informações colhidas em pesquisa sobre gestão municipal com foco nas Guardas Municipais de algumas cidades sergipanas procurei contextualizar o papel desse agrupamento no sistema de segurança pública.

A atuação da corporação vem sendo respaldada por bases jurisprudenciais e percepções de aspectos constitucionais, gerando certa insegurança quanto à legalidade dos atos praticados e sobre os limites de atuação dos seus agentes. Passados sete anos de sua regulamentação, as Guardas Municipais ganharam atribuições muito além daquelas preconizados pela Constituição, deixando de ser apenas executoras do policiamento administrativo ostensivo, da proteção da população, bens, serviços e instalações do município, expandindo cada vez mais o seu campo de atuação no âmbito do sistema de segurança pública.

Trata-se de uma instituição pública de caráter facultativo e criação exclusiva do Executivo Municipal. Portanto, há que se avaliar com muito critério a oportunidade a oferta à população de implantação de um serviço de Guarda Municipal perene e de qualidade. Chama a atenção o número crescente de cidades que implantaram o serviço de Guardas Municipais ou que aumentaram os seus efetivos. A pandemia também proporcionou aos agentes da Guarda Municipal um protagonismo que ainda não haviam experimentado, por sua atuação na linha de frente do cumprimento das medidas restritivas de controle sanitário da COVID-19, especialmente na prevenção de aglomerações em espaços públicos e do funcionamento das atividades econômicas, fazendo cumprir no âmbito municipal as determinações do Comitê Estadual Técnico-Científico de Atividades Especiais.

Mesmo sendo uma instituição que vem evoluindo e ganhando credibilidade como integrante do sistema de segurança pública, as Guardas Municipais sempre ficarão em segundo plano e tendo os louros do reconhecimento midiático creditados à Polícia Militar. A questão tende a se agravar à medida que as atribuições da GM vão se expandindo e ficando cada vez mais idênticas às da Polícia Militar. Alguns candidatos a prefeito no último pleito registraram no Tribunal Regional Eleitoral em seus programas de governo o compromisso de implantação ou expansão de Guarda Municipal nos municípios.

O que os eleitores jamais saberão é se os candidatos de fato avaliaram com responsabilidade essas promessas, pois a viabilização de tais serviços com qualidade e sustentabilidade, carece de avaliação técnica baseada na relação custo/benefício. Conversando com moradores de cidades que contam com o serviço da Guarda Municipal em Sergipe, não foi difícil constatar a total falta de conhecimento dos cidadãos sobre a função e limites de atuação de suas Guardas. Mesmo tratando-se de uma abordagem aleatória, identifiquei um ponto comum convergente para a absoluta falta de conhecimento sobre as atribuições e a atuação da corporação, além da função essencial de preservação patrimonial.

A visão um tanto negativa em relação a esse grupamento fica evidenciada à medida que aumentam a cada dia a ocorrência de depredações e o número de pichações em espaços públicos e privados do ambiente urbano. É inevitável ao cidadão ver uma nova pichação e não fazer associação direta com a falta de atuação preventiva das guardas municipais. Pior ainda é saber que ninguém será responsabilizado por pichar o patrimônio de alguém, seja por excesso de tolerância dos que acreditam tratar-se de manifestação cultural, seja pela falta de interesse dos agentes de segurança em cuidar desses “delitos menores”.

Acredito que as Guardas Municipais ficarão mais eficientes e baratas para os municípios se o modelo atual passar por mudanças, como por exemplo ser viabilizado através de consórcio regional, usando como parâmetro o modelo americano de departamentalização policial de territórios (County Sheriff), constituído para atuação regional, abrangendo vários municípios e onde todos os integrantes da força necessariamente residam no território (condado).

O Estatuto Geral das Guardas Municipais permite a existência das guardas por meio de consórcio em cidades limítrofes, entretanto as dificuldades para viabilização de arranjos regionais têm se demonstrado inviáveis. A dificuldade em operacionalizar consórcios de gerenciamento de resíduos sólidos e saneamento em Sergipe por razões de divergências políticas, é um exemplo de como são difíceis realizar essas parcerias. Meses antes do período de pandemia, fiquei indignado ao testemunhar uma pichação feita na extensão de um muro com cerca de 100 metros , pertencente a um condomínio de uma das principais avenidas da capital e que acabara de ser pintado. Imediatamente me veio à mente a pergunta: “Onde estava a Guarda Municipal que permitiu isso?”. 

Sabemos também do notório descaso da segurança pública em relação à depredação e pichação nos espaços públicos, pois os policiais sabem que não adianta prender vândalo que será liberado pelo juiz em audiência de custódia por tratar-se de infrator de baixo risco ofensivo. Acredito que se bem conduzido todo o processo de regulamentação e mediante estudo de sustentabilidade financeira, a Guarda pode assumir o protagonismo na segurança pública municipal.

Cidades de pequeno porte podem lançar mão de soluções locais mais eficientes e adequadas à realidade orçamentária do município. As Guardas vêm passando por mudanças e por certo sofrerão adequações na sua estrutura e forma de atuação. Hoje o que vemos são destacamentos instalados em bases improvisadas, efetivos defasados em relação à proporcionalidade de agentes por habitantes e total falta de visibilidade das ações aos olhos do cidadão.

As Guardas Municipais surgiram no contexto pós-constituição de 1988, como uma força de apoio e prevenção à criminalidade e redução das perdas através da proximidade no contexto da segurança pública, e para que esse objetivo se concretize, as Guardas regulares precisam empenhar-se em conquistar a confiança da comunidade e atuar de forma efetiva na preservação do bem público, adotando medidas cada vez mais preventivas, proativas e colaborativas.


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