A UNIVERSIDADE DA VIDA Manoel Moacir Costa Macêdo

Noticias, 29 de Abril , 2022 - Atualizado em 29 de Abril, 2022

 


A história de vida continuou em novas dimensões após à conclusão do curso de engenharia agronômica na Escola de Agronomia da Universidade Federal da Bahia - EAUFBA na década de setenta. Pontes e muros construídos e ultrapassados. Vitórias e derrotas, alegrias e tristezas. Meio século separam essas narrativas. Algoritmos, inteligência artificial e “modernidade líquida” eram futurismos. Curso universitário concluído. Engenheiro agrônomo diplomado. Anel somente na simbologia da colação de grau. Emprego certo e lotado na EMBRAPA Mandioca e Fruticultura em Cruz das Almas. Sonho de estagiário alcançado. Moradia no bucólico “Hotel da Embrapa”. Namorada certa com uma cruz-almense, com a qual constituímos uma união de mais de quatro décadas. Nenhum um dia desempregado. Cenários sem ameaças à vista. Ledo engano. Não existe controle absoluto sobre o dia seguinte. Não sabia que temos apenas o presente e o agora. O doloroso estava porvir no impermanente futuro.

Iniciada a caminhada profissional. Acolhido pelos novos colegas. Insegurança de iniciante. Devidamente instalado. Sala com mesa, estante, papel, caneta, lápis e borracha. Não haviam computadores. Possuía uma máquina datilográfica. Curso de datilografia concluído com certificado. Movido pela sensibilidade social, optei trabalhar com a cultura da mandioca. Cultivo de agricultores familiares e dos pobres do campo. Mãos à obra. Primeiro salário aguardado com ansiedade. Uma fortuna. Plano inicial de comprar um carro. Possuía a carteira de motorista. Acessório indispensável para o trabalho do jovem engenheiro agrônomo. Não cabia andar de bicicleta. Era “socialmente incorreto” para as contingências locais.

Realizado e feliz. Nada faltava. O imponderável estava por acontecer. Não construir espaços para o fracasso e desdenhava do futuro. Antes de completar o primeiro mês de trabalho, participei da festa de instalação da EMBRAPA Mandioca e Fruticultura. Empresa recém criada no rastro da modernização da agricultura e da Revolução Verde. Substituiu o Instituto de Pesquisa Agropecuária do Leste - IPEAL. Cada centro de pesquisa inaugurado, era um ato político e institucional. Autoridades federais, estaduais e municipais presentes. Civis e militares convidados. Televisão e jornal cobriam o evento. Empregados compulsoriamente “em pé e à ordem”. O jovem Ministro da Agricultura Alysson Paulinelli presidiu a inauguração. O Chefe Geral, o professor Raymundo Fonseca, o anfitrião. Comandante da VI Região Militar do Exército presente. Tempo de ditadura militar. Regulamente visitava a EMBRAPA e recepcionado com deferências. Quando possível, desaparecia dessas visitas. Risco de ser “fichado” pelo Serviço Nacional de Informações - SNI. Formalidades cumpridas durante a festiva instalação da nova unidade de pesquisa da EMBRAPA. À noite, jantar solene no salão de pé direito alto e preparado a rigor. Um bom garfo, comi à vontade. Mesa farta com a tradicional culinária do Recôncavo baiano.

Festa encerrada, recolhimento no mesmo hotel onde residia. Ao amanhecer, ao invés do sol nascente e canto dos pássaros, as dores estomacais. Diagnóstico simples: “a comida fez mal”. Convincente justificativa para quem “comia muito”. Auto medicação e resguardo. Ao invés de melhoras, dores insuportáveis. Dia seguinte, levado ao hospital da Santa Casa de Misericórdia de Cruz das Almas. Diagnóstico médico: “apendicite”. Preparado para a cirurgia. Horas seguintes, um novo diagnóstico: “infecção intestinal”. Internado por uma semana, nenhum alívio. As dores continuaram. Transferência para uma clínica médica em Salvador. Sem recursos e sem plano de saúde. O primeiro salário ainda estava porvir no final do mês. Novo diagnóstico: “febre tifoide”. Passados quinze dias, enfermo, fragilizado e diagnóstico indefinido. Febre, fraqueza, perda de peso e de sangue. Terapia: doses intravenosas de antibióticos. Desconhecia o “eu medonho” no espelho e os “meus demônios”. Vícios no ego. Ateu e materialista. Não ouvia os cânticos e nem as preces dos arcanjos. Carne e sangue renegavam o divino. Sofrimento sem diagnóstico e sem terapia. Um chamado a um novo paradigma de viver, dessa vez pela dor.

Jovem, formado e ferido. Sofrimento no corpo e no espírito. Sequelas e abalos na personalidade. Corpo e alma mergulhados no lodo. Ser humano do nada. Consciência da morte. Decisão inusitada: ruptura do tratamento e abandono da clínica. Retorno a Rio Real: “de onde vim e para onde vou”. Início e fim. De repente fui curado pelas glórias e bençãos dos “pretos-velhos, da espada de São Jorge, dos chás, banhos, preces, amuletos e dos tambores de Angola”. A universidade da vida traz surpreendentes lições na imensidão do universo sideral. Constantes surpresas e travessias.

Manoel Moacir Costa Macêdo é engenheiro agrônomo


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