SEMENTES

“Ontem o menino que brincava me falou

Que o hoje é semente do amanhã

Para não ter medo, que esse tempo vai passar

Não se desespere não, nem pare de sonhar” (Erasmo Carlos)

Que Itabaiana é de um pragmatismo radical, disso ninguém duvide. As características da terra, já parte do semiárido, com subdivisão radical e minifundiarização; crônica falta de transportes, só minimizado acerca de noventa anos atrás, fez-nos uma terra de pessoas de tez dura, dedicada ao trabalho intenso, à sobrevivência. Sem tempo para o cultivo da alma, além dos incessantes atos religiosos.

Na última metade de século, contudo, mesmo que lentamente, isso começou a mudar.

O marco de virada foi o jornal O Serrano, entre 1969 e 1974, especialmente, quando começou sua lenta agonia até morrer completamente, justo em função do pragmatismo gerado por outra novidade, muito mais abrangente: o rádio.

De qualquer modo, se no passado glorioso das letras sergipanas, para resumir, não tivemos nenhum João Ribeiro, Manuel Bonfim ou Silvio Romero, nos últimos cinquenta anos, “carregadores de piano” (cf. Francisco Tavares da Costa, o Fefi), têm buscado romper o citado pragmatismo radical, a começar do consagrado Vladimir Souza Carvalho. 

Nos últimos vinte e cinco anos, com a advento da Revista Perfil, publicação aracajuana, porém focada em Itabaiana, houve intensa movimentação no sentido do ativismo cultural, especialmente na literatura, com revelações, tipo Antônio Francisco de Jesus – Saracura. Com a contribuição universitária, máxime da UFS, desde 2006, com o campus Alberto Carvalho, em Itabaiana, o sucesso das bienais, e a fundação da Academia Itabaianense de Letras, esse ativismo atingiu a maioridade.

Vários agentes individuais e instituições de ensino têm contribuído para esse clima. 

Em agosto de 2017, a professora Rosa Maria Vieira de Santana, na direção da Escola Municipal D. José Thomaz, e inspirada na Academia Itabaianense de Letras, fundou a ASJE – Academia Serrana de Jovens Escritores, que muito tem produzido e inspirado outras unidades, até em outros municípios.

À esquerda, a primeira antologia organizada pela acadêmica, Prof. Inez Resende; à esquerda, em cima, renovação nos quadros do CAL – Centro Acadêmico-Literário, do Colégio O Saber; e embaixo, sessão conjunta da Academia Itabaianense de Letras, em recepção a Academia Serrana de Jovens Escritores, centrada na Escola Municipal D. José Thomaz, reprezentando cada um dos atuais componentes da AIL.

Se o ato da professora Rosa Maria já foi espetacular, maior surpresa não deixou de ser a ideia do Professor Emerson Maciel, prontamente encampada pelo casal Everton Souza e Lurdinha, dirigentes-proprietários da unidade privada de ensino, o Colégio O Saber, ao fundarem – e manterem – o CAL, Centro Acadêmico Literário do mesmo Colégio.

Porém, outras formiguinhas não têm deixado por menos.

Para mais não me alongar, na última quarta-feira, 14, foi lançado mais uma antologia, coordenada pela Professora Inez Resende. 

Local mais que apropriado, o lançamento foi no IFS, que ora completa 15 anos, e é, como já adiantado, o segundo trabalho do gênero, efetuado pela professora, que iniciou seu ativismo literário na Escola Municipal Benedito de Figueiredo, do bloco de conjuntos então de baixa renda, localizados no extremo leste do Bairro São Cristóvão. Ali, Inez desenvolveu, e ainda desenvolve, voluntariamente – hoje está aposentada – um excelente projeto de resgate e de promoção da ascensão social de quem nunca teve muito. Através da literatura. Textos e poesias publicados em livros, por gente que nunca sonhou ir além de mini frases numa tela de celular.

Quiçá esses garotos e garotas nunca evoluam além disso. Alguns, infelizmente já foram vítimas, inclusive fatais, da violência que ali tem imperado. Contudo, outros permanecem na estrada; deles que hoje frequentam o próprio IFS; e, certamente, serão içados ou içadas, por um momento sublime de se sentir maior do que a sorte, num primeiro momento, pareceu lhe reservar.

Parabéns à Professora Inez e todas as inezes que existem por aí; a todos que vão além da obrigação e conduzem à frente a humanidade.

Auditório do IFS, campus-Itabaiana: acima, ambiente da bonita solenidade de lançamento, preparada pela unidade de ensino, com direito a coral de alto nível; embaixo, após o lançamente especial, grupo diretamente envolvido, a começar (da esquerda) pelo diretor do campus, Prof. Jairton Mendonça de Jesus e a autora.

Lembrando que o financiamento da execução desse sonho se deu mediante os recursos da Lei Paulo Gustavo, portanto, federais, conduzidos administrativamente pela Secretaria Municipal de Cultura.

É pra isso que governo deve servir: a eunomia.

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