Número de ações cresce e alcança patamar histórico, segundo pesquisa concluída pela FGV
O número de ações judiciais contra operadoras de planos de saúde no Brasil alcançou um patamar inédito em 2024, com 298.755 novos processos registrados, mais que o dobro do total de 2020, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). As principais causas dessas demandas incluem negativas de cobertura para tratamentos médico-hospitalares, fornecimento de medicamentos e reajustes contratuais considerados abusivos.
Fato é que um em cada 16 usuários de planos de saúde no Brasil já acionou a Justiça contra sua operadora. Embora o índice pareça modesto, de apenas 6%, tal estatística representa cerca de três milhões de pessoas, considerando o total de aproximadamente 50 milhões de segurados no país. Os dados são da pesquisa “Raio-X da Saúde Suplementar no Brasil”, conduzida pela FGV.
A judicialização da saúde suplementar, fenômeno em que consumidores recorrem ao Judiciário para garantir acesso a tratamentos ou contestar decisões das operadoras, foi tema central do estudo, que ouviu dois mil brasileiros em todas as regiões do país, entre os dias 16 e 22 de maio deste ano. O levantamento incluiu tanto usuários quanto não usuários de planos de saúde e foi realizado em parceria com o Ipespe.
Entre os principais motivos que levam os usuários a entrar com ações judiciais estão as negativas de cobertura assistencial, com destaque para cirurgias (51%) e medicamentos (12%), somando 65% dos casos. Em seguida, aparecem a suspensão de contratos, muitas vezes por alteração de cláusulas (59%), cancelamento sem aviso prévio (19%) ou inadimplência (12%), e os aumentos nas mensalidades, responsáveis por 14% dos processos.
“O número de ações é impressionante e revela uma desconfiança estrutural dos usuários em relação às operadoras. A negativa de procedimentos que deveriam estar cobertos é o estopim para a maioria das demandas judiciais”, explica o advogado Thayan Fernando Ferreira, especialista em direito de saúde e direito público, membro da comissão de direito médico da OAB-MG e diretor do escritório Ferreira Cruz Advogados.
De volta ao estudo, os dados ainda revelaram que 78% dos entrevistados não conhecem o termo “judicialização da saúde”. Contudo, após uma explicação breve sobre o conceito, 63% dos participantes passaram a considerar essa prática como uma ferramenta legítima e eficaz para garantir os direitos dos consumidores.
Ainda para Thayan, o cenário é preocupante não apenas pela quantidade de processos, mas pelos reflexos na confiança do consumidor: “A judicialização se torna, muitas vezes, o único caminho viável para que o paciente receba o tratamento necessário. Isso indica que o sistema está falhando em sua função básica de proteger o usuário”, completa.
O advogado também aponta que a suspensão de contratos de forma unilateral por parte das operadoras, especialmente em momentos críticos, é uma das práticas mais agressivas. “Há casos de cancelamento de plano durante tratamentos oncológicos, o que é uma violação flagrante da boa-fé contratual e da dignidade do paciente”.
“A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) precisa atuar de forma mais eficaz na fiscalização das operadoras e na atualização do rol de procedimentos obrigatórios, garantindo que os consumidores tenham acesso aos tratamentos necessários sem precisar recorrer à Justiça. A judicialização não pode ser tratada como um problema do Judiciário. Ela é, na verdade, um sintoma da crise de confiança na saúde suplementar. E a solução passa pela revisão das práticas das operadoras e pela fiscalização efetiva das agências reguladoras”, finaliza o advogado especialista em negativas de planos de saúde.