“LETRIZAÇÃO” DO DEBATE ACADÊMICO por Manoel Malheiros Tourinho & Manoel Moacir Costa Macêdo

Manoel Moacir, 19 de Abril, 2024 - Atualizado em 19 de Abril, 2024



Foto: Universidade Federal Rural da Amazônia- UFRA

 


Tem sido redundante os escritos e falas, sobreo desarranjo moral e ético que vitima a sociedade brasileira, com realce em algumas de suas estruturantes organizações, como o Congresso Nacional. As suas raízes estão fincadas na religião, na escravidão e na educação, entre outros condicionantes. Destaque para a última, na formação acadêmica universitária, principalmente.

No último pleito para eleição do presidente da República, as religiões desligaram dos céus e ligaram os seus discursos e práticas na terra, apenas na terra. E o pior, como diz José AntônioPagola na obra O Caminho Aberto por Jesus,“infelizmente, o cristianismo, como é vivido hoje por muitos, não suscita ‘seguidores’ de Jesus, mas só adeptos de uma religião”.

As Igrejas, acantonadas em cada esquina citadina viraram células político-partidárias, verdadeiras “seitas””, que induzem os seus adeptos a apoiar candidaturas profetizadas comomessiânicas, embora passantes ao largo do caminho de Jesus. Inúmeros desses “profetizados” chegam ao Congresso Nacional com a Bíblia debaixo do braço, e se tornam imediatamente integrantes de grupos de pressão, que se sentemsuperiores na estrutura de poder a exemplo da bancada evangélica, da bala, do boi, entre tantas. Em verdade, Jesus Cristo, não criou nenhuma igreja e nem religião, ele trouxe um projeto civilizatóriopara a humanidade, muito além de seu tempo.

O lado da moeda congressual passa pela universidade, que tem no MEC - Ministério da Educação, a sua gênese indutora, sejam os Ministros da educação, de esquerda ou de direita.Alguns rechaçam Paulo Freire e suas pedagogias deconsciência e libertação. A universidade, que deveria ter o papel dialético de discutir a história, o presente e o futuro, não o fazem, tampouco dão sustentação a quem deseja fazê-lo.

A burocracia estatal em sua face atrasada, encarnada no MEC e representações, independente das origens partidárias, preferem encher as universidades com regulamentações que, cada vez mais, levam a comunidade acadêmica à alienação, apesar da existência de legislações vistas como lixo autoritário e advindas do período da ditadura militar. Um exemplo, é a lista tríplice para a escolha de Reitores e a proporcionalidade de votos que majorao poder de 70% para à categoria docente. Tais fórmulas terminam perpetuando um estado de anomia social das categorias de técnicos de nível superior e de alunos que, embora sejam tão importantes como a de professores, tambémindispensáveis a dinâmica acadêmica, tem seupoder de escolha reduzido a apenas 15% respectivamente.  

Algumas questões merecem respostas e aprofundamentos. Não é o alunado a razão de ser da universidade, por que então limitar a sua participação interna a míseros 15%? Qual a unidadeacadêmica, como os Institutos, prescinde de seus técnicos de nível superior, muitos qualificados, doutores, importantes na conexão extensão-pesquisa-ensino-administração, ministrando aulas inclusive? Por que então limitar a sua participação também aos reduzidos 15%?  Não somos todos, ativos importantes no conceito de educação superior na função universitária? Diante disso uma relevante pergunta, ainda exige resposta: Como pode o Congresso Nacional, a casa legisladora, e um Ministério da Educação, a casa executiva, formularem e agirem com políticas de equidade, se os seus representantes, deputados, senadores e executivos são formados religiosa e politicamente em ambientes carentes do igualitarismo? Oitenta e cinco por cento do parlamento nacional se declaram cristãos e com formação superior. A quem atribuir a culpa?

Por fim, uma explicação adicional sobre a“Letrização”. Os debates recentes, são executadosem sua extensão, via WhatsApp, ao invés de presenciais, democráticos, abertos, gestualidadevisível em ambiente público, sem o recurso tecnológico fechado, sugerindo um recurso que trafega entre a covardia e o medo. Para a professoraEsther Perel, da universidade de Nova York e especialista em relacionamentos contemporâneos, isto quer dizer "intimidade artificial". Para ela, estamos vivendo em permanente estado de atenção parcial. Nunca estamos 100% presentes. Nossa atenção está sempre dividida entre as pessoas e o nosso celular, mídias sociais, alertas de mensagem e assim por diante. Nesse contexto não é possível a “intimidade real”, e para nós outros, a “intimidade artificial”, não prospera e nem existe.

[Os autores agradecem a assistência da Professora Raimunda D’Alencar da UESC – Universidade Estadual de Santa Cruz, Ilhéus - BA].

 

Manoel Malheiros Tourinho e Manoel Moacir Costa Macêdo, são engenheiros agrônomos.

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