EQUIVOCADA INTERLOCUÇÃO ENTRE CIÊNCIA, POLÍTICA E ÉTICA: O CASO DA AMAZÔNIA por Manoel Malheiros Tourinho & Manoel Moacir Costa Macêdo

Manoel Moacir, 25 de Março, 2022 - Atualizado em 25 de Março, 2022

 


Por não se tratar de uma instituição absolutamente subjetiva, tampouco categoricamente objetiva, a ciência, tem o seu desenvolvimento alterado pela reflexão hermenêutica dentro da própria comunidade cientifica e pela busca destemida e incessante dos meios de comunicação, na tentativa de reduzir o distanciamento e a estranheza do discurso que a sustenta, em relação a outras dimensões da vida, a exemplo do senso comum, religião, ética e estética, pautando o debate e expondo suas teses, antíteses e sínteses. Condições necessárias à dialética da ciência como prática social, cujos processos de produção e apropriação do conhecimento precisam do reconhecimento social.

A Covid-19, por exemplo, trouxe para as ruas um movimento reacionário conhecido como “negacionista”, cujo propósito era contradizer os avanços da ciência em torno do uso de vacinas contra uma pandemia devastadora de vidas humanas. Venceu a tese do emprego universal dos meios preventivos, o estatuto da cientificidade. Venceu a razão, venceu um movimento Copernicanoa favor da imunização em massa, síntese resultante do processo crítico ao qual devem se submeter todas as ciências.

Um tema a ser tratado no espectro da dialética da ciência é a problemática ambiental, sobretudo, e com maior celeridade, o uso dos recursos naturais na Amazônia. Trata da relação “Sociedade-Natureza-Amazônia” expressa em uma pauta sistêmica de integração das “Natura Naturata e Natura Naturans”. A referência a esse assunto com jargões que vulgarizam, é tratar como degradação, ou mesmo alienação e irresponsabilidade,estimulando subliminarmente a destruição do maior patrimônio biológico do planeta, a Amazônia, sendo, portanto, qualificado como “crime de lesa-humanidade”.

O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia - IMAZON, organização não-governamental genuinamente brasileira, relata que em 2021 a Amazônia teve o maior desmatamento da década. A área florestal derrubada foi 30% maior em relação ao ano de 2020, mais de 8 mil km2 de área destruída. Outra fonte é o Relatório da “Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil - 2020”, divulgado pelo Conselho Indigenista Missionário - CIMI, cujo conteúdo causa perplexidade, a exemplo de “em meio à pandemia, invasões de terra e assassinatos de indígenas em 2020 aumentaram 141% em relação a 2018 [...]. “Os invasores, em geral, são madeireiros, garimpeiros, caçadores e pescadores ilegais, fazendeiros e grileiros, que invadem as terras indígenas para se apropriarem ilegalmente da madeira, devastar rios em busca de ouro e outros minérios, além de desmatar e queimar largas áreas para abertura de pastagens”.

Nas últimas semanas a questão ambiental esteve em foco na mídia popular e cientifica em razão do tratamento e uso de dados sobre a questão ambiental na Amazônia, as chamadas “Falsas Controvérsias” envolvendo professores e cientistas de “Mecas” do saber científico nacional, uma delas a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - EMBRAPA, conforme nota divulgada pelo Sindicato Nacional dos Trabalhadores em Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário - SINPAF. Não cabe julgar o “ser ou não ser bode expiatório” ou o “ser ou não ser dono de trajetória histórica tendenciosa”, mas refletir sobre a questão por fundamentos filosóficos, buscando em pensadores respeitados, formular uma teoria crítica, a exemplo do renomado acadêmico americano, Noam Chomsky na obra, “A responsabilidade dos intelectuais de falar a verdade e expor as mentiras”.

As organizações públicas de ciência, tecnologia, inovação e difusão estão capturadas por atores que voluntariamente se ‘acantonam’ nas tendas dos quarteis generais dos poderosos. Benditos ortodoxos de suas próprias lógicas de atrelamento ao poder. São pessoas tão especiais e induzidas psicologicamente a navegar com os privilégios que nunca desmamam. Mudam os comandantes e tripulantes, mas eles não desembarcam. São capazes de dialogar e merecer o acolhimento das estruturas dos poderes passantes, desde os mais empedernidos conservadores, conscientes socialistas, até os novos liberais da “metapoliticamundial”.

Com o espetacularização do uso de imagens de satélites para o monitoramento ambiental, as “realidades” passaram a ser operadas por códigos pessoais. Surgem os “algoritmos” e os interesses contrários as tradicionais visões e vivências.  A teoria crítica ao contrário, encoraja os intelectuais a desafiarem o Estado e o seu “entourage” ou, ainda, a considerar o desmatamento da Amazônia como fora dos códigos de ética e da moralidade, pela enorme violência que envolve. Nas palavras do monge beneditino Marcelo Barros, assessor das Comunidades Eclesiais de Base – CEB se deixar “amazonizar” é reconhecer que o “verbo se fez carne nos povos e na natureza da Amazônia” e dessa periferia do mundo pode vir a salvação de uma ecologia integral e profunda, não apenas para os brasileiros, mas para o planeta e o universo. Ao final, se é valido o agronegócio produzir alimento para o mundo, válido é também esperançar a Amazônia para o Brasil e para o planeta.

Manoel Malheiros Tourinho e Manoel Moacir Costa Macêdo, são engenheiros agrônomos.

 

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