*O jihadismo verde e amarelo.* (por Antonio Samarone)

Antonio Samarone, 15 de Novembro, 2022



 

As portas dos quartéis estão tomadas por pessoas pedindo um golpe, uma ditadura. Quem é essa gente? É um partido político, um sindicato, um movimento, uma seita?

Em que eles acreditam? Vão além da política? É uma nova seita, um culto? Claro, tem uma inspiração neofascista, mas isto só não explica tudo.

Por enquanto é um movimento de extrema direita, diferente do Ku Klux Klan e dos Supremacistas Brancos, nos EUA. No Brasil, eles se consideram “patriotas”, com tudo de negativo que o conceito significa. São “patriotas” dispostos a tudo: morrer ou matar pela causa. Qual é a causa?

São negacionistas? São os mesmos que negavam a vacina, o distanciamento social, defendiam o tratamento preventivo, rejeitavam as máscaras e que agora negam as eleições, os poderes constitucionais, o TSE e o STF? O que eles pensam?

Uma constatação: existe uma profunda dissonância cognitiva.

Eles acreditam em seus desejos, por mais absurdos que pareçam. É um negacionismo eleitoral, na mesma linha do negacionismo da vacina. Eles acreditam que o Alexandre de Moraes foi preso, que existe um golpe em andamento, que as forças armadas podem fechar o país e que estão chegando os contêineres com as armas. É o chamado terraplanismo.

A pergunta continua sem respostas: quem são os manifestantes que pedem abertamente uma ditadura? Quantos são e a quem representam? Ainda existe uma direita democrática, que aposta na democracia?

É uma direita religiosa de jihadistas tupiniquins, centrada nos princípios integralistas: “Deus, Pátria, Família e Liberdade?

É uma seita milenarista esperando um milagre, que algo grande está para acontecer. Na verdade, eles estão descolados da realidade.

Os símbolos fascistas entram aos poucos, como se fossem uma transgressão engraçada, uma rebeldia aceitável. A saudação romana já é praticada abertamente. Deixou de ser uma direita envergonhada, perdeu o pudor.

Chama a atenção, a ausência nas manifestações dos camisas amarelas, dos deputados e senadores recém eleitos. Ninguém aparece, nem os que fizeram discursos políticos radicalizados durante a campanha.

Eles não assumem a defesa de um golpe. O radicalismo era apenas eleitoral. Eles são muito apegados aos mandatos, têm pessoalmente o que perder.

Durante a campanha eleitoral, a disputa pela bandeira bolsonarista foi intensa. Cada um se apresentava como sendo os verdadeiros bolsonaristas.

Os políticos eleitos em Sergipe com a bandeira da extrema direita, estão em silêncio sobre as manifestações dos camisas amarelas. Não sabem se ganham ou perdem prestígio envolvendo-se na defesa do golpe.

As motociatas no interior do Brasil foram treinamentos para essas manifestações. Esse movimento nem é espontâneo, nem começou agora e está sendo regiamente financiado. Em Sergipe, todos sabem quem paga a conta do golpismo.

A questão não é só política, transcende, e mostra-se como um problema de Saúde Pública. Ninguém marcha, canta hinos militares, presta continência a um pneu, somente por insatisfação política. Assuma-se ou não, a histeria coletiva é visível.

A vitória de Lula ameniza politicamente, mas, além de não resolver a polarização tóxica, fortalece o subterrâneo das teorias conspiratórias. A extrema direita no Brasil é uma ideologia militante que tem bases na sociedade.

Lula fará um governo sequestrado pelo congresso, poder judiciário, tutela militar, mercado e mídias corporativa. A grande imprensa fará um jornalismo de guerra, contra o futuro governo.

Mesmo fazendo um governo moderado, Lula enfrentará uma resistência irracional dos camisas amarelas. O governo será sabotado!

A força de Lula é o seu prestígio internacional. As tarefas são o cumprimento imediato das promessas da campanha, o desarmamento das milícias e a desbolsonarização das instituições, sobretudo das forças de segurança.

Não se governa com o cutelo no pescoço.

Não existe acordo possível. O Brasil continuará dividido. A divergência principal ficou clara nessas manifestações: é entre democracia ou ditadura! Mesmo sendo uma democracia tutelada, desigual, limitada, não podemos aceitar a violência com forma de convivência.

Esses “patriotas” são os chamados “cidadãos de bem” que saíram do armário, é a antiga maioria silenciosa, que não aceitam a inclusão social. Eles acreditam que lutam pelo Brasil.

O paradigma dos patriotas é de alguém que pode morrer ou matar por suas crenças. O exemplo do meme do patriota abraçado ao para-brisa do caminhão é perfeita. Estes “patriotas” não irão desaparecer com a vitória de Lula.

A reivindicação de golpe pode ou não ser atendida agora. Os militares estão avaliando a viabilidade. Independente, a militância negacionista continuará, com novas pautas.

Concordo com a carta aberta de Boaventura de Souza Santos: o principal objetivo da extrema direita no Brasil é impedir que o Presidente Lula termine pacificamente o seu mandato.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

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