O nosso Quarup... (por Antonio Samarone)

Antonio Samarone, 08 de Dezembro, 2022 - Atualizado em 08 de Dezembro, 2022



 

Nestes dias tem morrido muita gente, mais do que o de costume. Diariamente, o meu telefone toca antes das sete. Eu já sei, morreu um conhecido. Atendo apenas para saber quem foi e onde será o sepultamento.

Penso como o meu patrono na Academia Itabaianense de Letras, Alberto Carvalho: “não receio o envelhecimento físico, nem a morte. Tenho medo é do embrutecimento mental.”

Por que as mortes por certas doenças são mais aceitas que por outras? Quando se pergunta: o falecido morreu de quê? O anunciante responde de boca cheia: Infarto fulminante. Morrer do coração é quase um ato de heroísmo.

Ninguém se sente culpado por morrer do coração, é como se ele tivesse vontade própria. Para quando quer. Já outras doenças são indesejadas, estigmatizantes, até os nomes são ocultados.

Saudade dos tempos em que os velhos morriam de queda, catarro ou caganeira e a caduquice era romantizada. O meu avô Totonho, morreu de velho aos 53 anos.

Parece que a Peste da Covid-19 naturalizou a morte. Foram tantos conhecidos, que perdi a conta. A ausência dos velórios apressou os esquecimentos. A morte virou apenas uma notícia.

Eu já planto árvores que crescerão para os outros. Nesses dias vou comemorar a chegada dos anos, serão 68. Não tenho ilusões: segundo o IBGE, a expectativa de vida aos 70 anos é de apenas 13,9 anos. Isso em média, podendo ser um pouco mais ou um pouco menos.

Vamos arredondar: se a morte não me encontrar por aí, comemorarei mais dez aniversários. Gente, essa conta não é só minha, vale para todos...

Vamos celebrar o nosso ritual do Quarup, antes que seja tarde.

Antonio Samarone (médico sanitarista)

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