DIA DE FINADOS - "TU ÉS PÓ E AO PÓ RETORNARÁS" (3,19)

Por Jerônimo Peixoto

Jerônimo Nunes Peixoto, 01 de Novembro, 2022 - Atualizado em 01 de Novembro, 2022

DIA DE FINADOS – “TU ÉS PÓ E AO PÓ RETORNARÁS” (Gn3,19)

Em todo o existir humano, a morte marcou presença na consciência de cada pessoa, inclinando-a ao bem, ou despertando-lhe para a terrível certeza de que um mal irremediável e implacável a ronda dia e noite até se tornar realidade palpável. Não morrer é o sonho de muitos. Sonho, e não concretude. Enquanto vivos, somos para a morte, porque esta é o termo da vida de todo o vivente. Mas, em certas ocasiões, a morte parece ganhar maior força, a ponto de dilacerar a esperança e interromper toda a sorte de sonhos.

Tudo é ilusório: “a vida do ser humano pode durar sessenta anos. Os mais fortes talvez cheguem a oitenta”, conforme o Salmo 90, 10. O recurso às armas, à violência instituída, à exploração dos mais pobres e dos excluídos também passam. Com o vai e vem da vida, nada se sustém, à exceção do AMOR e da MISERICÓRDIA que vêm de Deus. Antes de qualquer poder, de qualquer vantagem ou de toda a sorte de manipulação e de exploração, está a existência humana, como pressuposto de toda a possibilidade de gozo ou de fruição.

E o que mais dá sentido a vida é a morte. Quando experimentamos momentos cruciais, como foi o da Pandemia, instante em que diversas famílias testemunharam a dor da separação, da impossibilidade de um velório digno, de um ritual em que a família reunida pudesse se despedir, chorar, celebrar a passagem do parente ou do amigo, a vida parece ganhar maior valor do que o poder, a arrogância e a presunção. Aí, deparamos com o sentido real, profundo do viver: ser para os outros, servir, acolher, perdoar, recomeçar, descortinar o novo. Quando isso não ocorre, é a morte que visualizamos.

Ainda está entalado, na garganta de muitas famílias, o sentimento de revolta pelo descaso de certas autoridades que desdenharam da dor, ridicularizaram o sofrimento, sonegando verbas, omitindo vacinas, deixando faltar oxigeno, ocultando números, coibindo iniciativas regionais, retirando vagas e respiradores. O dinheiro que deveria salvar vidas, acabou desviado, e matou tantas pessoas. Contamos, na atualidade, mais de 688 mil mortes, das quais muitíssimas se poderiam evitar. O apego ao poder, o dinheiro, a arrogância e a impetuosidade mataram tantas pessoas, desfizeram sonhos, destruíram famílias, deixaram fendas profundas na alma dos brasileiros.

Neste dia de finados, quando reverenciamos os que nos precederam na eternidade, contemplamos todas essas vítimas desse mal, sufragando com uma prece, dando-lhes um obrigado, apenas afagando a lápide – onde foi possível ter uma – e, com o coração apertado, relembrar os momentos partilhados, as alegrias condivididas, os sonhos planejados, o futuro que não se concretizou. Haverá, ainda, força para uma oração, nos mais variados credos, e nas mais diversas formas de expressão religiosa, a fim de que a Divindade, fonte de toda a vida, digne-se de acolher e de dar feliz termo à existência terrena, introduzindo na IMORTALIDADE – para nós cristãos, o Reino dos Céus, esses entes tão caros e que nos deixaram de alma ferida. Haverá, também, razões para pedir, por sua intercessão, novos tempos para o país divido, vazio de tolerância, pleno de artimanhas vis e desprezíveis. Teria restado fé verdadeira ou ficou um pouco de hipocrisia destituída do mais puro sentido cúltico?

Imersos numa polarização política enorme, e tendo passado pelo pleito eleitoral, em segundo turno, no último domingo, temos uma razão a mais para nos conscientizarmos sobre o VALOR DA VIDA, e a expectativa da morte: não somos oniscientes, nem onipotentes... Nossa arrogância, nossa presunção e nosso exagerado gosto pelo poder passam e se dissipam como nuvens ao vento, semelhantemente a quimera, que insiste em não ganhar concretude. É, pois, momento de todos, derrotados e vitoriosos, com seus séquitos apaixonados, voltarmos o olhar para o cemitério. Veremos que não valem a pena tantas barganhas e tantos engodos, se, no mais íntimo encontro com a consciência, o que resta é um sepulcro ou o crematório como perspectivas. Triste sina, para os incrédulos!

A morte é justa e igualitária. Se, na vida, a arrogância divide as pessoas em manipuladas e manipuladoras, exploradas e exploradoras, pobres e ricas, incrédulas e crentes, a morte as faz única realidade. Olhar para o cemitério permitir-nos-á enxergar a nossa pequenez e nos fará entender que a sociedade é palco da vida de todos, local de partilha, de solidariedade, ensejo de fraternidade e de convivência, na divergência, sem ódio, sem desfaçatez, sem má-fé. A economia, a política, o trabalho, a moradia e as demais benesses sociais são para todos, e não uns que se dizem iluminados pela falsa ideia de um Deus que divide, manipula e engana.

Neste dia de finados, seja o cemitério o local da profecia, da adoração, da experiência com Deus e com o próximo, a fim de que possamos compreender a mensagem da vida e a da morte, para nos tornarmos um país fraterno, justo, solidário e unido. Nossa brasilidade deve ser mais forte do que o individualismo e o ódio que se instalaram. Um dia, poderemos voltar ao cemitério para nunca mais sair. Enquanto é tempo, demo-nos as mãos e abramos o coração. Façamos da vida uma oportunidade para reverenciar a morte, favorecer a vida e apostar na Esperança da Imortalidade feliz, na Eternidade, onde seremos todos semelhantes a Deus. R.I. P.

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