PALAVRAS QUE CADUCAM

Por Jerônimo Peixoto

Jerônimo Nunes Peixoto, 15 de Dezembro, 2022 - Atualizado em 15 de Dezembro, 2022

PALAVRAS QUE CADUCAM

Todos os idiomas latinos (descendentes do Latim) têm termos semelhantes, com significados diversificados, e muitas delas possuem dialetos (uma forma própria de falar a língua que destoa da língua oficial, acabando por ser quase um outro idioma), o que dificulta a compreensão de uma língua, mesmo dentro do mesmo país.

Em nosso Brasil, embora haja uma extensão continental, não há dialetos oficiais, apesar de haver sentidos variados para uma mesma palavra, a depender da região. Isso é fruto dos costumes, das tradições, ou da dinâmica que envolvem a cultura de nossas regiões brasileiras. Mas, para não andarmos longe demais, com arrodeio exagerado, aqui mesmo, nas plagas serranas, encontram-se alguns vocábulos especiais, de ontem e de hoje, que identificam uma marca acentuadamente peculiar em nossa Língua portuguesa e já estão caducando. Vejamos algumas:

Por não ter acochado bem a rocha, como seu Antônio sempre arrochou, e como Zé, irmão, sempre acocha, Manoel se viu arrochado quando a pedra caiu da carroça. Sua mula desbandeirou-se mundo afora e foi um atropelo que arregula ter sigo uma trovoada. O animal entrou no milharal e foi desbandeirando as espigas emente os grãos ficaram sem pele. Foi um horror ver aquele horror de milho sendo quebrado, só pro mode a burra estava desembestada.

O labafero foi tanto que os fios de arame se romperam e as vacas de Sinhá Maria fizeram um trovejo que só se viu poeira nos ares, coisa pra mais de três horas de relógio. Aquele animal não vale uma pataca. Onde já se viu dizer que uma mula fizesse tantas trampicolas assim? Eu mesmo não vou numa marcação dessa, nem que Deus me bote benção!

Isturdia, foi Fulô quem fez uma patacoada besta, umas armadas sem proveito, ao dizer que seu negócio se empampuçou adis pois que ela deu a macacoa, duas vezes empareiadas(emparelhadas). Dixero que ela tava de boi! Sá Maria, indagorinha, asseverou ter sido uma pinima, um achaque que a abalou do tanto que quase levou a bichinha a bater a cassuleta. Uma incramidade (calamidade), pra bem dizer! Não fosse eu, com as minhas orações, e comadre Zefa cas dela, Fulô estaria prantada em sete palmos e sua sogrinha torta estaria aos prantos. Deus tá nos permita!

Dito de Janjão, um estouro de rapaz, fornido, pregou um susto na mãe, porque amanheceu com o estalicido dos brabos. Só faltou botar os bofes pra fora, quando soltou o catarro. Inhá Maria, a rezadeira do Pamandu, tacou-lhe dente de aio no bucho, e ele, esmorecido, deu uma de valente, no mesmo instante. Enriba da hora já estava traquinando com as moças da redondeza e já querendo torejar. Só não levou uma no espinhaço, pro mode Marieta deu de cara. Marieta é matreira, massista, gosta de dar amassada em tudo que é gente. Basta ter negócio com ela! Com ela, tudo é no prumo!

Libório de Antero, procopão velho, nunca quis saber de cocotinhas, nem de arrumar cordão de saia algum. Viveu para Jesus, sem nunca se esbrenhar (embrenhar) na pouca vergonha. Era rezador de sentinelas, de novena e de adjuntos de gente da gaita. Muitas moças sonhavam em se encambixar com ele, mas era sem valia. Nasceu já procopão e tinha a sina pra outras bandas. Mas tinha pavio curto. Qualquer pendenga já era motivo para arengar e deixar o tempo escuro com o desmantelo de seu cabedar. Muito tucudo, era um horror o trovejo dele! Dizem que, de quando em quando, na quadra de lua cheia, ele se encantava, quando não se encabocava, e cometia desaugeros de varar a noite. Batia a coxia estrada afora e não dava o vurto por uns quatro dias. Só dava nova quando o caboco lhe saía dos esprito.

Quem tinha um impe de raiva era dona Caboca, filha da finada Merentina, uma matrona de respeito, dada às rezas da igreja. Sabia o fiço de có e ainda dava pra todos os cantos, à procura de cativar as almas para Deus, nosso Senhor. Era dona apalacada, de juízo certo, que nunca se alotou com seu ninguém. Se cassoar, ela morreu do jeito que nasceu, sem pelejar com homem! De tempos em tempos, ela ficava invaluemo, mas tinha tino! Nunca se viu desacorçoada e nunca fez infuca. Nem Carrola, sua madrasta, que era virada na rapa da peste, tirava-lhe o ar de alma boa. Era meio desincha vida, que nem melão de sancaetana, ingá, ou chuchu cru. Mas era do caritó, sem enxirimento, sem prova na espoleta. Moça de linha! Foi enterrada com pano branco!

Já Carrola, madrasta de Caboca, não vestia cale for, deixando os mamões meio desforrados, não tinha papa na língua, nem era morfina. Quando via uma infuca, metia-se ou ficava bispando um instante para insultar, praguejar ou atiçar alguém. Certa feita, sestrou a casa de sua tia, por causa do parabelo do marido dela que se enredou com a vizinha e foi uma fuzaca da binga. Eronide, tio torto de Carrola, era butado a valentão. Tinha bala no roló e andava com um tira pé de uma garrucha nas costas que fazia medo. No cós, tinha um buião encardido que parecia um urinol de flandres sem esmalte. Era um desmantelo sem esquadro!

Por enquanto, encerra-se o assunto, enquanto se assuntam mais outros termos que se vão perdendo no desuso de uma gente brava e abusada. Se entendeu todos os termos, você é um bom tabaréu, ou uma digna matuta, de peso!

Jerônimo Peixoto.

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