DIA DE FINADOS

Por Jerônimo Peixoto

Jerônimo Nunes Peixoto, 01 de Novembro, 2023 - Atualizado em 01 de Novembro, 2023

DIA DE FINADOS 

Se o grão de trigo caído na terra, não morre, permanece apenas um grão; se morre, produz muitos frutos” (Jo 12, 24).

Muito cedo, a comunidade dos seguidores de Jesus, os chamados primeiros cristãos, depararam-se com a oração pelos mortos, nas catacumbas, sobretudo por força do martírio (=testemunho) que muitos fiéis a Cristo ofereciam, ao se deixarem entregar aos perseguidores romanos, pelo simples fato de serem discípulos e discípulas de Jesus. O império tinha seus deuses e não poderia se rebaixar a um deus que era cultuado por pobres e marginais, seguidores de um galileu peregrino...

A oração pelos mortos, porém, além de ser um bálsamo para a alma dos parentes e conhecidos, uma forma de consolo e de fortaleza, unia-os à comunidade de fé, pelo vínculo do testemunho cristão. Chegar ao ponto de considerar a vida um nada significava maturidade robusta na fé e na esperança, certezas conscientes da Ressurreição dos mortos, isto é, continuidade da vida, para muito além da morte. Neste sentido, vem o testemunho de Paulo de Tarso: “viver para mim é Cristo; morrer para mim é lucro” (Fl 1, 21) e, noutra passagem, “quer vivamos quer morramos, pertencemos ao Senhor” (Rm 14,8).

Quem se faz verdadeiramente discípulo de Cristo morto e ressuscitado coloca sua vida nas mãos do Senhor, isto é, aposta inteiramente na Divina Providência, de modo que o viver é Cristo e o morrer é Cristo. Isso não surge do nada. É preciso fazer uma experiência de encontro, confrontando o nada de si com o Tudo de Cristo, para assumir todas as consequências de que inúmeras pessoas, ao longo da história, foram capazes. E isso, na mais radiante e intensa alegria, sem resmungar, sem choramingar. Somente quem aposta tudo no Senhor vitorioso sobre a morte pode passar por essa experiência. O amor que nutre por Jesus é tamanho que não lhe falta mais nada, senão viver correspondendo ao Amor Radical de entrega e doação.

Certa feita perguntaram ao Servo de Dom Deus Luciano Mendes de Almeida, em que momento ele desfrutava de um lazer, e ele respondeu, sorrindo: “não tenho lazer”! A vida dele se tornou mera ocasião para servir, para de desvelar em doação pelo Reino de Deus. E isso desperta no próximo uma capacidade imensa de também servir e de amar, que gera uma grande rede, cujos pontos são unidos pelo Amor a Deus. Quem vive assim, na radicalidade do Amor a Deus, julga-se um nada ante o Grade Mistério de Amor, que é Deus.

Leonardo Boff certa feita afirmou: “Não considero a morte como o fim da vida. “Morrer é um acabar de nascer. A vida vai para além da morte. Morrer é penetrar no coração do universo onde todas as teias de relação encontram o seu nó de origem e de sustentação”  (em entrevista). Tal afirmação nos enriquece o espírito, para poder afirmar que somos seres diferenciados, vocacionados à uma plenitude de vida que não se dará totalmente nesta vida terrena. Neste sentido, morrer é abrir os olhos para ver Deus, para um nascimento novo, pleno de felicidade e de realização. E isso é aberto a todos, indistintamente. Basta que cada um se deixe envolver por essa experiência fantástica que a Vida exerce sobre sua vida.

O dia de finados tem, pois, esse escopo: fazer com que reflitamos sobre a vida, com uma perspectiva para além túmulo, para além da cremação, para além da urna funerária. Mais: permite-nos acreditar na Vida Plena, tal como ela não se encontrará jamais, nesta esfera existencial, porque a materialidade é pobre demais, frente a tão grande dádiva. Apegar-se a tudo o que aqui é vantagem significa morte. E morrer para isso tudo significa Vida. Só os místicos compreendem esse desiderato divino e, por isso mesmo, chamam-nos a atenção.

A reflexão sobre a vida comporta, sim visita aos túmulos, aos locais onde se depositam as cinzas... para que sentir a pequenez da vida distante de Deus. Também, para compreender a Magnitude da Vida com Deus! O cemitério e as cinzas nos sugerem o nada, despertando-nos para a justiça que a morte realiza: atinge indistintamente a todos. Se, enquanto vivos, buscamos nos distinguir entre os que têm e os que não têm, entre os dignos e os indignos, a morte apaga tudo isso, ao nos jogar na vala dos que feneceram.

E a Plenitude da Vida, para quem é? Para os bons? Para os justos? Não! Se assim fosse, ninguém nela tomaria parte, pois ninguém é justo e bom diante de Deus. Mas, porque a misericórdia de Deus nos iguala, tornando-nos aptos, a Plenitude da Vida é para todos. Os critérios são divinos e não humanos. Por mais que tenhamos a inspiração, a última Palavra é de Deus.

Consolemo-nos! Esforcemo-nos! Vale a pena experimentar o Deus Amor que chama  todos à Plenitude da Vida, ao Novo Nascimento, à Produção de Frutos Bons! É extremamente agradável mergulhar na Fonte Renovadora da Vida, mesmo fazendo a passagem pela morte. Isso só descobriremos quando estivermos convictos de que “nem a morte, nem a vida podem nos separar do Amor de Deus”(Rm8,39). Aí, sim, seremos tudo em Deus. Um ótimo dia de finados para todos!

                                                                       Jerônimo Peixoto

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